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Opinião

Francisco Mota Ferreira

Ainda compensa ter um franchise?

14 de novembro de 2022

De cada vez que nos focamos nos problemas no imobiliário, a maior parte das vezes centramo-nos nas dificuldades dos consultores e raras vezes nos debruçamos sobre os dilemas e questões que dizem respeito a quem deu um passo adicional na carreira do imobiliário e arriscou criar uma marca ou aderir a um franchise de uma com créditos já firmados no mercado.

Abrir uma agência ou ser um master não é, automaticamente, garantia de sucesso. Se não formos uma IAD ou uma EXP por exemplo que, como sabemos, não têm loja física, há as despesas fixas inerentes ao facto de ter casa aberta: renda do espaço, limpeza das instalações, água, luz, comunicações, etc.

Depois, junte-se a estas os gastos s que decorrem da actividade imobiliária: licença AMI, pagamento de um fee a advogados, CRM, site e restantes ferramentas de marketing, etc.

E, por fim, a contratação de profissionais que escolhem a nossa marca em detrimento de outra(s): isso vai implicar investimentos fixos com pessoal administrativo e (pelo menos) um director comercial. Naturalmente, esta estratégia de Recursos Humanos passa igualmente por cativar um sem número de consultores imobiliários que possam optar por aderir ao nosso projecto. Para isso e por norma, tal obriga a que sejam dadas condições aos futuros consultores que levem estes a escolher-nos porque o esquema de comissões é-lhes mais vantajoso, porque não pagam formação, etc. Ou apenas porque sentem que existe um rumo, uma estratégia e um objectivo na nossa marca que não encontram noutras.

Se estamos a criar uma marca nova, juntem a todas as despesas que acima enumerei o risco adicional de ter-se um novo player no mercado. Eu sei que, para o comum dos mortais, que não consegue distinguir entre a Remax A ou a Remax B, é-lhe indiferente esta questão: ele só quer comprar ou vender o seu imóvel e escolhe aquela marca ou aquele consultor porque, naquele momento específico, fez-lhe sentido. Ou porque o profissional mereceu-lhe confiança e credibilidade. Ou, no limite, porque foi o mais persistente e não o largou até ter o contrato firmado.

Porém, admito que existe uma franja de potenciais clientes que ligam à marca e acham que é com uma em específico que vão ver o seu problema resolvido. O que, como sabemos, pode ou não ser verdade, mas, acima de tudo, porque também resulta de uma aposta e estratégia de notoriedade e de algum trabalho de casa que foi feito que coloca a marca Y em destaque em relação às outras. E, novamente, se pensarmos numa nova marca que se quer implementar no mercado, terão todos estas questões para responder, para além dos problemas inerentes que referi nos parágrafos anteriores.

Por seu turno, quem avança ao abrigo de uma marca já conhecida, tem ainda a questão adicional de pagar o fee pelo uso da marca mãe, com um sem número de obrigações, que se traduzem, na sua maioria, em muitos deveres e pouco direitos.

Uma forma de controlar as despesas (e tentar obter receitas de forma mais rápida) passa pela contratação massiva de consultores, algo que algumas agências são mais exímias que outras e que as leva a uma estratégia concertada de tentar roubar os melhores ao mercado. Claro está que, pelo meio, não abdicam de contratar também jovens promessas e profissionais inexperientes que, no limite, mesmo com a perda de tempo que por vezes há em formar um consultor que passado alguns meses sai, há sempre algo que este deixa para trás, quanto mais não seja angariações e/ou potenciais leads.

E é assim, essencialmente, que os franchisados têm gerido o seu negócio. Muitas vezes colocando em causa a sua própria sobrevivência, porque estão obrigados a uma série de compromissos com o master ou a marca mãe. Foi por isso é que, no meu último artigo, fiz questão de realçar algo que, para mim, começa a ser demasiado óbvio: quando o sector entender que, por norma, o que é pago a um franchise pode não compensar, em termos líquidos, o que este diz oferecer (nomeadamente a divulgação dos imóveis e potenciais leads).

Acredito, aliás, que no dia em q o sector perceber que a maioria do negócio vem dos portais generalistas e não das redes, os sites próprios das marcas e a estratégia de franchise tem os dias contados. Em Portugal, corre-se ainda a contraciclo e, por isso, mesmo com tudo a indicar que o céu pode cair-lhes em cima da cabeça, todos acham que amanhã ainda não será a véspera desse dia.

Francisco Mota Ferreira

Trabalha com Fundos de Private Equity e Investidores e escreve semanalmente no Diário Imobiliário sobre o sector. Os seus artigos deram origem aos livros “O Mundo Imobiliário” (2021) e “Sobreviver no Imobiliário” (2022) (Editora Caleidoscópio).