
Lisboa: Lesados do Concurso 29 do Programa Renda Acessível organizam-se para reagir à anulação do sorteio
Um mês depois de verem o sonho da casa própria desfeito por um “erro humano” e pela decisão do executivo camarário, os 133 candidatos afetados pela anulação do Concurso n.º 29 do Programa de Renda Acessível da Câmara Municipal de Lisboa estão a organizar-se. Movidos por indignação e sem meios aparentes, um pequeno núcleo começou a mobilizar os lesados numa tentativa de resposta colectiva à decisão do executivo liderado por Carlos Moedas — que, até ao momento, não apresentou qualquer pedido formal de desculpas.
A tarefa revela-se complexa. A primeira dificuldade é, simplesmente, saber quem são os lesados. “As pessoas não se conhecem. O que se tem, no máximo, é a lista dos números sorteados, sem identificação ou forma de contacto”, explica um dos elementos que dinamiza o movimento.
Ainda assim, começaram a surgir as primeiras iniciativas: foi criada uma página no Facebook, circula uma petição online e um grupo de WhatsApp tem servido de ponto de encontro para troca de informações e apoio mútuo. Além disso, vários candidatos uniram esforços para reunir fundos e partilhar custos legais, com o objetivo de avançar com uma queixa formal contra a autarquia.
A revolta é evidente. Para estas famílias, o email enviado pela Câmara a comunicar a anulação do sorteio não foi um simples acto administrativo, mas o ponto de ruptura de um processo emocionalmente extenuante. “Em 24 horas passámos da euforia à frustração total. Isto não se resolve com uma compensação em dinheiro. Queremos a casa que nos foi atribuída”, desabafa uma das candidatas sorteadas.
Carlos Moedas assumiu publicamente o erro, classificando-o como um “ato humano” e afirmando que foi corrigido em tempo útil. “Foi uma situação que não deveria ter acontecido. Como presidente, a minha função é proteger. Todas as pessoas têm o direito de errar”, declarou o autarca, minimizando os efeitos da anulação ao dizer que não existia uma “lesão de expectativas” porque o sorteio não foi público. Mas os juristas consultados pelos lesados não partilham dessa leitura e contestam afirmando que decisão de anulação tem consequências.
A Câmara decidiu avançar com a repetição do sorteio. Por despacho da vereadora da Habitação, Filipa Roseta, o Concurso 29 será hoje retomado, 27 de junho, às 15h30, na Sala de Concursos do Edifício Central dos Paços do Concelho. Estão novamente em jogo «as mesmas» 133 habitações, para as quais permanecem submetidas 7.362 candidaturas. O sorteio será transmitido em direto no site da autarquia.
Para os lesados, porém, o que está em causa vai muito além da repetição de um ato administrativo. Trata-se da dignidade de quem viu uma oportunidade rara escapar sem aviso, e de exigir ao poder público responsabilidade — não apenas técnica, mas também humana.