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Descida de preços será inevitável no imobiliário português, e provavelmente será violenta

31 de março de 2020

É um dos maiores promotores portugueses, Sérgio Ferreira, CEO da Coporgest tem no portefólio mais de duas dezenas de projectos imobiliários. Iniciou a sua actividade em 2005 e mesmo antes da crise posicionou-se na reabilitação urbana na cidade de Lisboa.É um dos maiores promotores a actuar na capital portuguesa e o ano passado entrou pela primeira vez na construção de um hotel de 5 estrelas.

Em entrevista ao Diário Imobiliário, revela que perante esta pandemia e os impactos no sector, na economia, no país e no mundo, "se as medidas forem concebidas por políticos profissionais, burocratas e teóricos universitários, não vão resolver grande coisa".

O que vai acontecer ao mercado imobiliário depois desta pandemia?

Desde há muitos meses que tenho defendido que o mercado imobiliário português estava a caminho de uma desaceleração, ditada por uma conjugação de múltiplos factores que não vale a pena repetir.

Essa desaceleração, que foi negada por muitos dos meus concorrentes, tornou-se bem visível em 2020, mas nunca imaginei que a travagem do sector viesse a ser tão agravada por uma crise pandémica. Ninguém imaginou.

Tudo indica que esta primeira vaga do Covid-19 possa ser ultrapassada em dois meses, mas será provavelmente seguida de novos episódios de pandemia.

Neste entretanto, a crise económica vai instalar-se com muita violência, com o desemprego a aumentar, o consumo a regredir, as receitas fiscais a baixar, tudo numa escala duríssima e ainda por cima global.

Mesmo com medidas de injecção massiva de fundos na economia, imagino que as pessoas serão mais lentas a decidir investimentos e mais avessas a gastar dinheiro.

Por isso, mantenho aquela que era a minha opinião, agora ainda com mais veemência: a descida de preços será inevitável no imobiliário português, e provavelmente será violenta, sobretudo para as localizações menos qualificadas.

Qual o impacto na sua empresa?

Na nossa unidade de negócio do short-term rental, sob a marca LISBON BEST APARTMENTS, já sentimos um impacto brutal: não facturamos, e assim nos manteremos por uns meses, até que as pessoas ganhem confiança para voltarem a viajar.

Nos projectos imobiliários, como eu antecipava uma crise, há dois anos que não fazemos investimentos.

Temos uma situação financeira robusta e capacidade para aguentar algum tempo.

Por essa razão, não antecipo medidas muito drásticas, sem prejuízo de monitorar a situação e em cada momento tomar as decisões que entenda apropriadas.

Que medidas são necessárias tomar para minimizar esta situação?

Esta vaga pandémica será ultrapassada, mas será seguida de novos surtos de infecção.

A vacina tardará, mas é muito provável que em breve surja um tratamento eficaz que permita encurtar o tempo de recuperação e evitar esta corrida desenfreada aos serviços de saúde.

O problema seguinte é igualmente grave: a crise económica será global, profunda e duradoura.

Muitos Estados com situações financeiras mais frágeis – veja-se a Itália ou Portugal – não terão recursos suficientes para implementar medidas e aguentar o impacto económico e financeiro desta situação.

As instituições internacionais como o FMI e o BCE vão de injectar volumes astronómicos de dinheiro, provavelmente novo, para tentar atenuar os efeitos desta crise, mas acredito que ainda assim essas medidas terão eficácia limitada. 

Mais: se essas medidas forem concebidas por políticos profissionais, burocratas e teóricos universitários, não vão resolver grande coisa.

Os Estados deveriam recorrer ao pragmatismo e experiência dos empresários e gestores, para tentarem conceber medidas verdadeiramente eficazes, e que sejam à prova-de-bala contra os truques dos oportunistas que sempre surgem nestas situações.