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Opinião

Gonçalo Roxo, cofundador da Your Property Advisor

As peripécias do mercado imobiliário e (possíveis) soluções

15 de novembro de 2022

Parece que nos dias de hoje, o direito à habitação, consagrado na Constituição da República Portuguesa há 46 anos, é um direito cada vez mais difícil de alcançar, principalmente no que aos jovens diz respeito.

Sabe-se que muito desta “culpa” está nas condições económicas precárias em que estes jovens se encontram: 15,9% (dados da Eurostat) encontra-se em situação de desemprego e, de acordo com um estudo da Fundação Calouste Gulbenkian, há cada vez mais jovens a receber salários próximos do salário mínimo. Mas a outra parte da “culpa” está no próprio setor. Ora, vamos por partes.

Começo pelo mais influente, que, neste momento, é o aumento do preço médio de venda do m2. Entre junho e agosto, em Lisboa, por exemplo, este valor situava-se em 4.817€, de acordo com um estudo do Casafari. O mesmo estudo revelou o aumento de 5,45% no preço de venda dos imóveis e 23,2% nos arrendamentos. Isto já sem falar da pouca oferta imobiliária no mercado, do aumento dos custos de construção, dos elevados impostos sobre as rendas, acrescidos do IMI, e a zero facilitação de créditos, que torna a situação ainda mais insustentável.

Como podemos contrariar as estatísticas que dizem que Portugal é o país da União Europeia onde os jovens mais tarde saem de casa dos pais se não conseguimos dar-lhes condições? É também importante destacar que o problema não está no preço das casas, mas sim nos baixos salários, e, aí sim, também estamos no topo, da maneira mais negativa.

Como se não bastasse, aqueles que conseguem superar estas dificuldades encontram outra pelo caminho: a burocracia.

Existem várias entidades envolvidas no processo de compra de casa: medidores de crédito, bancos, notários, sem falar em toda a documentação que é necessária ainda antes sequer de se avançar com o processo de compra. A experiência neste processo é geralmente tão negativa que os compradores acabam, muitas vezes, por desistir.

Mas nós podemos fazer melhor e está na altura de mudarmos a realidade portuguesa.

Espanha, por exemplo, criou um apoio mensal de 250 euros para ajudar os jovens entre os 18 e os 35 anos a pagar os custos de uma primeira habitação. Ainda neste verão, Madrid duplicou o investimento no programa Mi Primera Vivienda (A minha primeira Casa) para 18 milhões para ajudar os jovens com menos de 35 anos a adquirir a sua primeira habitação. Dentro deste programa, uma das medidas é a concessão de até 95% da hipoteca na primeira casa.

Para que haja uma oportunidade de baixar os preços dos imóveis há que equilibrar a procura com a oferta. Ou seja, tem de existir novas propriedades, aumentando o leque de oferta, que poderá permitir a redução dos preços.

Também as políticas de habitação poderiam ser mais robustas. A eliminação do IMT na compra de habitação própria e a isenção do imposto de selo, são alguns exemplos que iriam beneficiar os jovens na compra da primeira habitação. Só nos impostos os custos rondam cerca de 8%, que já se traduzem em valores expressivos.

Quanto à burocracia, está na altura de simplificar. O futuro do mercado imobiliário vai passar pelas inovações tecnológicas. A tecnologia blockchain, que permite armazenar dados sem poderem ser alterados, tornaria o processo mais simples e transparente ao tornar os Conservatórios e Notários digitais. Sendo uma estrutura descentralizada e autorregulada, a blockchain armazena o histórico de dados, informações legais e processos. O maior benefício seria, sem dúvida, a redução da burocracia porque não há a necessidade de ter intermediários no processo. O seguinte benefício seria a segurança. Sendo uma estrutura encriptada não há o risco de cometer fraudes.

Já os NFTs (Token Não-Fungível) iriam permitir a emissão de contratos digitais simplificados e a redução do tempo no processo de compra de casa, que neste momento se deve ao envolvimento de demasiadas entidades e entraves a nível de recursos humanos nestes serviços, pela sobrecarga de trabalho. Ou seja, tornar o imóvel e a sua escritura em NFT tornaria estes ativos únicos, que não podem ser alterados nem reproduzidos, dando a garantia ao comprador da sua exclusividade.

Seria mais lucrativo para todos se a burocracia e os encargos fossem simplificados e tornados mais eficientes. O caminho perspetiva-se longo e moroso, mas deve começar-se por algum lado, se quisermos sair desta “cepa torta” que é o direito à habitação no mercado imobiliário português.

Gonçalo Roxo

Cofundador da Your Property Advisor

*Texto escrito com novo Acordo Ortográfico