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Ter uma licença AMI

11 de janeiro de 2021

Já vos tenho aqui escrito sobre as agências de imobiliário e, nalguns casos em concreto, na forma como estas encaram o mercado e, também, os profissionais que acolhem. Tenho a noção que há sempre algo a apontar, quer do lado dos consultores, quer do lado das agências que estes representam e tenho imensa pena que qualquer uma das partes não tenha, às vezes, a coragem de ir para o meio da ponte para que todas se entendam e fiquem felizes. Talvez seja por isso que inúmeros consultores deixam as marcas que representam e acabam eles próprios por tirar uma licença AMI: porque cada vez menos se revêm nesta selva de agiotagem que algumas agências do imobiliário se tornaram.

Conheço excelentes profissionais que estão inseridos em agências e que nunca pensaram em dar este passo porque se sentem bem e confortáveis na marca que representam (e que os representa). São profissionais respeitados, com muitos anos de experiência, que são ouvidos internamente e, como tal, não pensam em abandonar quem os acolhe. Não apenas porque se estão bem onde estão, mas porque também sabem que entre eles e a empresa vigora uma verdadeira relação de parceria, onde as premissas que os juntaram se mantém em vigor (e, nalguns casos, até reforçadas).

Quero aqui igualmente dizer-vos que conheço também excelentes consultores que desistiram de representar agências e representam-se apenas a si próprios. A uma dada altura das suas vidas sentiram que não fazia sentido estar a partilhar o seu sucesso com a empresa onde se encontravam porque os princípios que os tinham juntado tinham há muito deixado de existir: os pagamentos das comissões devidas ocorriam tarde e a más horas, as imposições para formações e outras despesas apareciam inesperadamente, os negócios passavam cada vez mais pelos contactos pessoais do consultor e cada vez menos por intervenção da agência, que continuava a reclamar mais de metade da comissão para negócios que tinha participação zero. Em consequência disso, a relação equilibrada de direitos e deveres entre as partes estava muito a favor da empresa e pouco do lado do consultor e a decisão de ruptura acabaria por ser tomada.

O que também reparo nisto tudo é que existe por parte das agências, nomeadamente dos brokers, uma enorme desconfiança em relação a quem decide enveredar pelo caminho de ter uma licença AMI própria. Contam-me da deslealdade que é estes consultores poderem oferecer ao cliente comissões mais baixas do que as que são normalmente praticadas pelo mercado, da facilidade com que estes conseguem enganar os clientes, estragando negócios e dando má fama à profissão e ao sector entre (muitas) outras variadas queixas.

Porque conheço e trabalho com ambos os casos, confesso-vos que é-me muito difícil saber de que lado está a razão. Há bom e mau em todo o lado e, como diz o ditado, conhecer a árvore não é saber o caminho da floresta. E, ao longo deste meu percurso, nesta minha vida imobiliária, já conheci de tudo: excelentes profissionais que trabalharam sempre em agências; excelentes profissionais que têm AMI própria; agiotas que trabalham em agências e aldrabões que (felizmente) apenas se representam a si próprios.

Ou seja, não há receitas mágicas. O importante, diria eu, é que cada um se sinta bem no papel que escolhe e que o represente com verdade, confiança e dignidade. E, se as coisas correrem menos bem, saberem que têm sempre a opção de mudar. Pode-se dizer o pior do imobiliário e de quem aqui trabalha. Mas, que me recorde, não há sector que seja mais abrangente que este, que tenha mais oportunidades e que nos permite, se assim o desejarmos, novos recomeços.

Francisco Mota Ferreira

Consultor imobiliário