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Opinião

 

Se tens duas pernas e respiras vem ser consultor imobiliário!

24 de novembro de 2020

O título está, obviamente, exagerado, mas acho que reflecte muito do que se passa actualmente no sector. Hoje em dia, por não haver regulação nem controlo, a porta está, não só aberta a que toda e qualquer pessoa possa ser consultor imobiliário, mas literalmente escancarada para que, quem assim o queira, poder experimentar. O que leva a que, por arrasto, toda e qualquer empresa possa adoptar a táctica de “respirou? entrou”, (uma expressão bastante feliz do meu amigo Nuno), que implica muitas vezes, zero selecção dos candidatos.

Não me levem a mal e percebam que eu acho que todos temos direito a tentar ser bem-sucedido nesta profissão, sendo que esta é, talvez, das poucas que neste momento tem sempre espaço para mais um. E tem-no porque, lá está, não há qualquer triagem nos candidatos que são recrutados.

Esta ausência de escolha decorre também porque, para uma empresa há, desde logo, lucro e lucro potencial. Mesmo que os consultores desistam ao fim de meia dúzia de meses, já pagaram qualquer coisa à empresa – formação, marketing, etc. E, com sorte, ainda angariaram alguns imóveis que poderão ser até vendidos depois -  eu sei que a regra vigente é a de respeitar que as angariações que fazemos são nossas, mesmo quando saímos da empresa, mas todos sabemos que são pouquíssimas as que respeitam isso mesmo. E também por isso a norma é os consultores voltarem a angariar na agência B o mesmo imóvel que tinham angariado na agência A.

Lamentavelmente, o importante neste momento é a quantidade e não a qualidade. As empresas recrutam às pazadas – quantos de nós recebemos convites numa base regular? – tendo por ideia base tentar suplantar a ideia de crescimento desmesurado da marca líder de mercado. Em consequência, os seguidores de outras marcas vão atrás desta obsessão. E os impactos no mercado desta estratégia pouco filtrada sentem-se no sector.

O primeiro impacto desta estratégia é sentido pelo consultor e pelo cliente. Após uma formação, quantas vezes mal-amanhada, o consultor vai para a rua representar a marca que o escolheu (ou que ele acha que escolheu). E as consequências desta impreparação vêem-se no contacto com o cliente que pode não escolher a agência X ou até nenhuma outra porque teve uma má experiência.

Sejamos concretos: o comum dos mortais não consegue distinguir que a marca Xamer Azul, que acabou de conhecer através da experiência de um mau profissional, não tem nada que ver com a Xamer Verde que, por sinal, tem excelentes consultores que se dedicam em pleno à resolução dos pedidos dos seus clientes. Em consequência, nós que até nem trabalhamos na Xamer, quando vamos ter com o cliente é mais do que comum ouvirmos a frase: “espero que você não trabalhe com a Xamer”, sem culpa nenhuma para nós ou para os milhares de profissionais competentes que a marca tem.

E depois, claro está, há os loucos que viajam na maionese. Quando ouço responsáveis com muito mais anos que eu no imobiliário dizerem que querem que a empresa X tenha, ao fim desse ano, mais 200 consultores, entre comerciais, líderes de equipa, expansão e chefias, é de quem não tem a noção. Não tem a noção que este mercado tem uma enorme rotatividade – muitos pulam de agência em agência até encontrarem a que se identificam melhor ou a que pode dar mais comissões, apenas para dar um exemplo – e não ter a noção que, para termos 200 a trabalhar connosco precisaríamos, seguramente, de contratar cinco vezes mais (e rezar para que os que ficassem fossem profissionais do sector e não nos envergonhassem nas primeiras saídas que fossem fazer).

Enquanto se apostar na quantidade e não na qualidade, haveremos de ter sempre quem acabe por estragar tudo aquilo que uma enorme minoria está neste momento a tentar fazer para credibilizar um sector e uma profissão.

Francisco Mota Ferreira

Consultor imobiliário