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NOTÍCIA
Opinião

Carla Matos, Sócia de Clientes Privados, e Júlia da Costa Ribeiro, Associada de Clientes Privados da CCA Law Firm

As incongruências do novo regime de tributação das mais valias imobiliárias para não residentes

17 de maio de 2023

No âmbito do Orçamento de Estado de 2023, o legislador consagrou que as mais-valias imobiliárias obtidas por não residentes passavam a ser obrigatoriamente (sendo tributadas em somente 50%) englobadas e consequentemente tributadas às taxas marginais (14,5% a 48%).

Note-se que durante algum tempo (até precisamente maio de 2021, data em que foi proferido um Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo), o regime jurídico da tributação das mais-valias imobiliárias obtidas por não residentes fiscais em Portugal suscitava a seguinte dúvida: quando tributadas à taxa de 28%, o rendimento deveria ser considerado em 50% (o que corresponderia a uma taxa efetiva de 14%), ou deveria antes ser considerado em 100%?

Ora, como já referido, em maio de 2021, o Supremo Tribunal Administrativo, veio estabelecer que aplicação da taxa dos 28%, a 100% do saldo das mais-valias imobiliárias estava em desconformidade com o artigo 63.º do TFUE, na medida em que restringia os movimentos de capitais entre Estados-Membros e entre Estados-Membros e países terceiros.

Assim, após essa data passou a ser unanimemente reconhecido pela Jurisprudência, e também pela Doutrina, em Portugal, que o saldo das mais-valias imobiliárias, obtidas por não residentes fiscais, em Portugal, seriam somente tributadas em 50%, à taxa de 28%.

No entanto, e apesar deste entendimento ser unanimemente reconhecido, a verdade é que, até agora, a Autoridade Tributária, em momento algum, o reconheceu, tendo até à presente data emitido liquidações de IRS considerando 100% do saldo das referidas mais-valias.

Assim, na prática, o que tem acontecido, é que somente os contribuintes mais atentos e com mais possibilidades financeiras têm conseguido a aplicação correta da lei, através de recurso para o tribunal arbitral ou para os tribunais judiciais. Esta prática abusiva, ainda se torna mais visível e abusiva, quando a Autoridade Tributária, em circular emitida 14.04.2022 vem dizer e passamos a citar o seguinte:

Quanto aos rendimentos de mais-valias imobiliárias auferidos por sujeitos passivos não residentes, até 31/12/2022, cujas liquidações tenham sido ou venham a ser objeto de procedimento ou processo tributário, mantém-se em vigor o entendimento no sentido da aplicação do disposto no nº 2 do artigo 43º do CIRS aos sujeitos passivos não residentes, considerando-se o saldo das mais-valias imobiliárias em apenas 50% do seu valor, sujeito a tributação autónoma à taxa especial de 28%

Assim, será possível que se admita que a Autoridade Tributária (O Estado Português) se permita somente aplicar a Lei (cuja interpretação assume, não lhe levanta dúvidas) quando o cidadão recorra a processo tributário (CAAD, Tribunais)?

Se tal for permitido à Autoridade Tributária, isso significará que, para o ano de 2022, a Autoridade Tributária conscientemente emitirá, mais uma vez, liquidações de IRS ilegais que somente serão colocadas em causa caso os contribuintes possam recorrer judicialmente das mesmas.

Carla Matos, Sócia de Clientes Privados e Júlia da Costa Ribeiro, Associada de Clientes Privados da CCA Law Firm

*Texto escrito com novo Acordo Ortográfico