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Opinião

 

Os imóveis a preço e o preço dos imóveis

22 de setembro de 2020

Já aqui escrevi que seria desejável que, quando os consultores aceitam angariar um imóvel, não o façam a qualquer custo e, fundamentalmente, a qualquer preço, principalmente se, com esta opção, estão a queimar este imóvel no mercado e a ter um nado-morto entre mãos. Igualmente pertinente neste cenário é que, quem vende, perceba a real mais-valia de ter um consultor imobiliário a trabalhar consigo e, já agora, que aceite as opiniões e o expertise de quem, em teoria, poderá genuinamente ajudar na venda do seu activo.

Dito isto, não vos faz imensa confusão que compradores, vendedores e profissionais do sector aceitem todos entrar no jogo das propostas, dos preços negociáveis e dos saldos? Eu percebo que possa fazer parte do desafio e da nossa tradição de negociadores – certamente algo herdado da passagem dos povos comerciais pela Península Ibérica e cujos resquícios ainda se encontram no nosso ADN – mas tenho para mim que a coisa era francamente mais simples se fosse assumido por todos que o preço que está publicitado é o preço final.

Não tenho quaisquer dados científicos a sustentar a minha teoria, mas acredito genuinamente que, para além de pouparmos todos imenso tempo, iríamos vender mais depressa, a contento de todas as partes. Querem um exemplo?

Um casal vai visitar um imóvel. O preço está ligeiramente acima do que podem pagar, mas este casal acredita que, se fizer uma proposta abaixo do valor, o proprietário pode considerar vender. Neste cenário, este casal acha que o proprietário pode ter esta necessidade de venda urgente, porque sabem que o activo está à venda há meses ou por qualquer outra razão e conseguem ter sucesso. Agora imaginem que o proprietário não aceita porque a proposta foi muito abaixo da atençãozinha que se procura ter na compra de um imóvel.

O que acontece? Se este imóvel teve mediação imobiliária, o consultor arrisca-se a perder várias coisas. Perdeu os clientes, que não vão comprar com ele e vão procurar outro imóvel que possa ir ao encontro da pechincha que pretendem obter, ou do valor que conseguem pagar (e provavelmente com outro consultor); perdeu tempo, porque acabou por acompanhar as visitas, sem que isso se tenha traduzido num sucesso (faz parte do processo, eu sei); e arriscou-se a perder o proprietário, porque se as visitas não se traduzirem numa venda efectiva ao fim de um tempo, o mais certo é o contrato não ser renovado.

Por outro lado, e também talvez por culpa nossa, há toda uma espécie de achismo no sector (e sim, eu terei também a minha quota parte em alguns).

O proprietário acha que o seu imóvel vale X e nós, que sabemos que vale Y (sendo que Y é, por norma, abaixo do valor), aceitamos o contrato nesses termos, sabendo que, se não funcionar, podemos sempre pedir para reduzir o valor da venda.

O cliente, que procura um imóvel que vai ao encontro do que nós temos angariado acha que, se gostar, pode fazer uma proposta abaixo do valor ou até mesmo nos perguntar directamente se aquele é o preço mínimo.

E nós consultores, como já referi, temos sempre a preocupação de ver com o proprietário qual é a margem que este tem para negociar e, naturalmente, fazemos o mesmo com o potencial cliente.

Imaginem isto nas transações comerciais que vamos fazendo ao longo do dia. Era um caos, certo? Eu percebo que, no caso do sector imobiliário em Portugal, a negociação faz parte do jogo. Mas, às vezes, não ficam com a sensação de que tudo isto é uma enorme perda de tempo e uma canseira para todos os intervenientes?

Francisco Mota Ferreira

Consultor Parcial Finance