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Opinião
Para além da conformidade: A classificação energética como ativo estratégico no mercado imobiliário português

Mojtaba Kamarlouei CTO e Co-fundador da Builtrix.

Para além da conformidade: A classificação energética como ativo estratégico no mercado imobiliário português

20 de maio de 2025

No competitivo mercado imobiliário de Portugal, os edifícios estão cada vez mais a ser valorizados não apenas pela localização ou design, mas também pela sua eficiência energética, habitabilidade e custo-benefício a longo prazo. Edifícios com classificações energéticas mais elevadas não só reduzem as emissões, mas também oferecem contas de energia e custos de manutenção mais baixos — fatores importantes num contexto em que Portugal sofre com o aumento dos preços de serviços públicos e da crescente procura por ambientes mais saudáveis e resilientes. Os Certificados de Desempenho Energético (CDE), antes vistos apenas como ferramentas de conformidade, estão a tornar-se indicadores estratégicos do valor dos ativos. Apartamentos e moradias com melhores classificações energéticas podem agora alcançar preços mais elevados, atrair investidores atentos aos critérios ESG e alinhar-se com os regulamentos europeus de sustentabilidade. Neste novo cenário, a classificação energética não se resume a quilowatts — trata-se de capital.


A ascensão (e lacuna) das etiquetas de eficiência energética

A avaliação do desempenho energético de ativos construídos não é novidade. A UE introduziu os CDE, que classificam os edifícios de A+ (mais eficiente) a G (menos eficiente). Inicialmente, os CDE eram ferramentas de conformidade, mas agora há sinais de que se estão a tornar indicadores de investimento, utilizados em mecanismos de financiamento público e portfólios alinhados com os princípios ESG. Foram concebidos para atuar como sinais de mercado: um sinal verde para edifícios de alto desempenho e um alerta para os imóveis ineficientes que podem ficar fora do interesse do mercado. Entre 2015 e 2024, foram emitidos mais de 2 milhões de CDE em Portugal. A parcela de edifícios classificados como A e A+ aumentou de apenas 4,5% para 35,5%. Embora esse crescimento seja notável, reflete sobretudo novas construções e renovações. Nos edifícios existentes - que dominam o mercado - menos de 5% atingem a classificação A, e mais de 85% permanecem entre C e F. Quase um terço está classificado como E ou F, revelando uma lacuna persistente de desempenho no parque edificado nacional.

Apesar disso, o mercado começa a recompensar o desempenho energético. Diversos estudos portugueses confirmam que edifícios bem classificados vendem-se por um valor superior: até 13% mais para apartamentos e 5-6% mais para moradias isoladas [1]. Propriedades classificadas como A em Portugal atingem, em média, uma valorização de 9,3% em relação às classificadas como D. Pesquisas em toda a Europa corroboram essas tendências, com casas classificadas como G a perder até 3,4% em valor [2].


A desconexão: dados sem aplicação

Portugal ainda não aproveitou totalmente o potencial da sua base de dados de CDE (SCE.pt). Ao contrário de outros mercados da UE, como a Alemanha ou os Países Baixos, os dados dos CDE não estão atualmente ligados à tributação imobiliária, taxas de hipoteca ou incentivos públicos à renovação. Como resultado, a maioria dos CDE são gerados durante uma transação ou renovação e depois ficam esquecidos por anos. Isso faz com que investidores, gestores imobiliários e compradores focados em ESG trabalhem com dados de desempenho desatualizados.


O ponto de viragem: de retratos estáticos à monitorização inteligente

Este cenário está a começar a mudar. Com a implementação de contadores inteligentes, dispositivos IoT e dashboards com inteligência artificial, o acompanhamento em tempo real do consumo de energia torna-se viável em larga escala. A implementação em massa de contadores elétricos inteligentes por operadores de rede como a E-REDES em Portugal torna essa transição ainda mais possível. Utilities e proprietários de edifícios podem agora monitorizar continuamente o desempenho energético, integrar contextos operacionais e climáticos e identificar ineficiências com precisão - sem necessidade de atualização de hardware. Isso significa que empresas imobiliárias e fundos de investimento imobiliário (REITs) podem passar da conformidade passiva para a inteligência energética ativa.

O acesso a esses dados deixou de ser apenas uma ferramenta de sustentabilidade - é agora um ativo empresarial. Com a ascensão dos regulamentos SFRD e do capital alinhado ao ESG, os edifícios com classificação energética verificável estão melhor posicionados para obter financiamento, atrair inquilinos e proteger os seus portfólios para o futuro.


Como alcançar o Green Premium?

O setor imobiliário português encontra-se num ponto de viragem. De um lado, um legado de edifícios com fraco desempenho e dados isolados; do outro, um caminho para uma sustentabilidade orientada por valor. Os CDE podem e devem evoluir de certificados estáticos para sinais ativos de desempenho. A tecnologia já existe, os dados estão disponíveis. O que falta é uma mudança de mentalidade.

Num mercado cada vez mais influenciado pela finança verde, pelo escrutínio dos investidores e pelas políticas da UE, os vencedores serão aqueles que transformarem o desempenho energético numa vantagem competitiva - e alcançarem todo o valor de optar pelo verde.

[1] Residential price premiums for energy efficiency | Portuguese Economy Research Report

[2] The price premium of residential energy performance certificates: A scoping review of the European literature - ScienceDirect

Mojtaba Kamarlouei, CTO e Co-fundador da Builtrix