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Opinião

 

As regras das comissões

4 de janeiro de 2021

Quando, ao abrigo de uma determinada marca, acedemos ao convite para trabalhar como consultores imobiliários, aceitamos igualmente os direitos e deveres que essa responsabilidade acarreta. E, pela nossa parte, esperamos que o acordo de cavalheiros que foi firmado entre as partes seja cumprido e honrado entre todos. E reforço acordo de cavalheiros porque, como certamente saberão (e se não sabem deveriam saber), não há nenhum contrato, pelo menos juridicamente válido, que seja firmado ao abrigo de uma prestação de serviços (vulgo “recibos verdes”). É, aliás, por isso, que os consultores que passam estes recibos são chamados de “trabalhadores independentes”. E são-no, quer em relação a si próprios, quer em relação à empresa que representam (ou dizem representar).

É por ser um contrato em prestação de serviços que as empresas se ilibam de pagar um ordenado e o que é acordado entre as partes são as comissões sobre a venda dos activos que os consultores angariem, à custa do seu trabalho, tempo e esforço. Isso é, genuinamente, o que interessa e faz o negócio funcionar. E os consultores aceitam estas premissas porque também sabem que há determinadas despesas que não têm – advogados, marketing, divulgação, etc. – porque a empresa que os acolhe assegura essa parte.

Dito isto, confesso-vos que me faz uma enorme confusão que as empresas do imobiliário achem que têm funcionários a trabalhar para si. Não têm. Têm profissionais independentes que aceitam dividir a comissão do trabalho que fazem – a angariação de activos – ao abrigo de um acordo que é, em muitos casos leonino e que não é cumprido pelas partes e, em muitos casos, visto como um negócio vantajoso para a empresa e, na maior parte dos casos, pouco vantajoso para o consultor. Mesmo com as supostas divulgações internacionais em portais que nunca ninguém ouviu falar e que não geram quaisquer leads (apenas para vos dar aqui um exemplo das muitas promessas não cumpridas das agências de vão de escada que pululam por aí).

Há empresas que, felizmente, já perceberam que isto funciona (ou só pode funcionar) se for uma relação de parceria e a contento de todas as partes. É por isso que temos agências que pagam até 95% da comissão, outras há que não têm lojas físicas, outras que percebem que é de todo o interesse delas partilhar com os comerciais os leads que recebem e tantas outras vantagens que fazem com que esta relação seja de uma verdadeira parceria em que o consultor não se importa de partilhar o seu sucesso com quem, genuinamente, caminha ao seu lado.

Porém, pelo que me vou apercebendo do mercado, a maioria ainda é, infelizmente, dominada pelas agências dos chicos espertos, que acham que os consultores são empregados deles. São as empresas que querem que estes paguem as formações, os leads e o material de marketing e que obrigam a estar em escala a receber as pessoas que vão à agência – até porque é francamente mais barato do que pagarem a uma qualquer administrativa – e os que inventam todas as estratégias para ganhar dinheiro à conta deles.

Percebam isto: a agência não está a gastar dinheiro convosco, mesmo quando vos diz que vos oferece material de marketing, formações ou o que seja. Está a fazer uma aposta que, por norma, lhe corre bem. Porque, quando vocês se fartarem e baterem com a porta, os imóveis que angariaram com sorte ficam por lá. Porque vão adiando o pagamento das vossas comissões. E porque, acima de tudo, são eles que ficam com a parte de leão da comissão dos activos que vocês angariaram. Vocês não lhes estão a fazer nenhum favor e, seguramente, não têm de cumprir com as patetices que algumas agências inventam para ainda vos explorar mais. Se calhar, é também por tudo isto que referi, que cada vez mais temos consultores imobiliários com licença AMI própria. Cansaram-se de tanta exploração. Este será o tema para o meu próximo artigo.

Francisco Mota Ferreira

Consultor imobiliário