CONSTRUÍMOS
NOTÍCIA
Opinião

 

2021

28 de dezembro de 2020

Nos anos mais dramáticos de inflação galopante no Brasil, quando se aproximava o final de Dezembro, os brasileiros já nem sequer se esforçavam para desejar um ano melhor relativamente aos 365 dias que teriam pela frente, optando sempre por saltar, pelo menos, um ano. Argumentavam eles que já sabiam que o que se aproximava ia ser mau e, portanto, nada melhor do que esperar que o seguinte a esse fosse, pelo menos, melhor.

Em Portugal ainda não sabemos como vai ser 2021, mas, se tivesse que escolher uma palavra para este ano que se avizinha, diria que será desafiante. E, no que ao nosso quintal diz respeito, acredito que sê-lo-á para os nossos clientes, os consultores imobiliários, as empresas e respectivas agências e o Governo. Mas vamos por partes.

O chip dos nossos clientes mudou. E quem ainda não percebeu isso em 2020, vai andar em 2021 a apanhar papeis. O Covid, o confinamento e o teletrabalho mudaram todo o conceito de habitação. Em muitos casos, as casas hoje em dia têm de cumprir a dupla função de lar e de local de trabalho. E a tendência será que este fenómeno se aprofunde, com os clientes a procurarem imóveis maiores, em zonas mais calmas e sossegadas, mas onde não deixem de ter acesso a todas as comodidades e benefícios a que estão habituados. Ou seja, o novo normal é morar bem, com espaço para os filhos crescerem em liberdade, mas onde o digital assume uma importância fundamental. As pessoas querem qualidade de vida, sem perder os benefícios da modernidade ou a facilidade de acesso à cidade mais próxima.

O que pode baralhar estas contas? Uma palavra apenas: moratórias. Muitas famílias conseguiram adiar por um ano o pagamento da prestação da casa (e também de alguns créditos associados). Em consequência disso mesmo, nos últimos meses tem-se assistido a uma retracção do mercado, com imóveis a serem retirados do mercado ou a manterem-se a preços pré-Covid como se nada tivesse mudado neste panorama. Esta artificialidade irá manter-se até Setembro de 2021, podendo dominar a tendência de mercado e, naturalmente, o desejo (ou vontade) dos clientes de venderem ou comprarem outro imóvel. Por isso, a minha sugestão é a de que, tendo clientes compradores (ou, em menor medida, clientes vendedores), agarrem-nos bem porque podem ser uma ave rara a avistar em 2021.

O próximo ano será também desafiante para os consultores, as agências e as empresas. Não sei se estaremos ao nível da última crise imobiliária, mas confesso-vos que vejo o próximo ano com bastante apreensão: se há um aparente recuo na compra e venda de activos imobiliários – estou aqui a falar apenas no que diz respeito ao mercado residencial – o que é que podemos esperar? Um desafio constante na busca de soluções para os clientes que se enquadrem na realidade pós-Covid que, espero, comecemos a viver em meados de 2021.

As agências e as empresas terão que se adaptar e tentar sobreviver. Se a força motriz das suas receitas – os consultores comerciais – estiverem em dificuldades, o que acham que irá, invariavelmente, acontecer, às empresas que os acolhem?

2020 mostrou ser um ano com alguma elasticidade nesta matéria, com dezenas de empresas a abrir, mas outras tantas igualmente a fechar passados meia dúzia de meses. Acredito que só as mais resilientes e as que percebem o que aí vem serão capazes e vencer 2021. Empresas que apostem no seu marketing, na sua comunicação e na divulgação nas redes sociais. Que procurem os clientes onde estes se encontram e lhes incutam a confiança perdida pelos tempos de incerteza que todos estamos a viver.

O ano que rapidamente se aproxima será igualmente um desafio para o Governo, que recebe a partir de Janeiro e durante seis meses, a presidência do Conselho da União Europeia. Serão meses muito duros, em que a imagem de Portugal estará sob um escrutínio ainda maior e onde nada, em teoria, deverá falhar.

Finda a presidência, aproximar-se-ão, a passos largos, a data do fim das moratórias bancárias e os primeiros sinais de que milhares de famílias não irão conseguir honrar os seus compromissos junto da banca. Em Outubro de 2021, o Governo terá que entregar a proposta de Orçamento de Estado para 2022 e, pelo figurino do que se viu este ano, será uma tarefa hercúlea terminá-la com sucesso. Sem a limitação constitucional, decorrente das eleições para a Chefia de Estado, (que aconteceu este ano) e sem a desculpa da responsabilidade da Presidência Portuguesa da UE, o novo Presidente pode convocar novas eleições em caso de chumbo orçamental, levando o país a viver em regime de duodécimos até à aprovação de um novo Orçamento de Estado por um novo Governo (o que, no melhor cenário, só teria lugar em 2022).

Apesar das nuvens negras que se avistam no horizonte, desejo a todos e a cada um de vós que tem a paciência de me ler uma excelente entrada em 2021, fazendo votos que os cenários catastrofistas que acima descrevi sejam apenas isso mesmo: cenários.

Francisco Mota Ferreira

Consultor imobiliário