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Os activos imobiliários são e vão continuar a ser uma classe de activos segura e muito procurada

15 de maio de 2020

Miguel Batista, CEO da Lusoproa, é um jovem promotor com vários projectos em desenvolvimento, em Lisboa, em Setúbal e no Algarve e em tempo de pandemia as obras continuaram, porque parar não é uma opção.

A marca Lusoproa nasceu em 2018, no entanto, Miguel e Diogo Batista, irmãos e sócios da empresa, já com alguns anos de actividade são neste momento um dos grandes promotores imobiliários do país.

Miguel Batista, em entrevista ao Diário Imobiliário, acredita que vão surgir alterações, muito influenciadas pela experiência que estamos a viver e que estas serão de muito maior relevo do que qualquer oscilação nos preços

O que vai acontecer ao mercado imobiliário depois desta pandemia?

Os activos imobiliários estão entre os que que oferecem maior consistência e segurança no longo prazo mas que apresentam alguma sensibilidade a choques no curto prazo.

Dito isto, a nossa visão é de que os activos imobiliários são e vão continuar a ser uma classe de activos segura e muito procurada.

Acreditamos que vão surgir alterações, muito influenciadas pela experiência que estamos a viver e que estas serão de muito maior relevo do que qualquer oscilação nos preços.

Vimos as nossas casas de um dia para o outro a serem transformadas em escritórios, escolas e ginásios.Tivemos que conviver com a falta de privacidade, espaço e arrumação. Passámos a valorizar a compartimentação dos espaços interiores e a existência de espaços  exteriores. Tivemos que lidar também em muitos casos com a falta de eficiência acústica, térmica e energética das nossas casas, factores que eram desprezíveis e que agora se tornaram de maior importância.

Percebemos também que despendemos demasiado tempo em deslocações muitas delas desnecessárias e que possivelmente estamos a pagar um preço demasiado alto para termos escritórios em zonas prime, quando, em alguns casos, precisamos de menos espaço, com melhores acessos e menos trânsito, para desempenharmos as funções que têm que ser necessariamente presenciais.

Acredito portanto que vamos assistir a uma mutação das nossas necessidades e exigências enquanto utilizadores de espaços e também na forma como os preços são construídos. Não há choques que não tragam mudança, e penso que estas são algumas das que podemos vir a assistir nos próximos anos.

Qual o impacto na Lusoproa?

Temos sentido os impactos em vagas diferentes. Inicialmente existiu a possibilidade de as obras pararem por tempo indeterminado e tivemos que gerir o tema com especial cuidado até mitigarmos o risco. Quando percebemos que a paragem estava fora de cena, identificámos que existia já uma quebra de confiança generalizada no mercado com que teríamos que lidar. O facto de financiarmos as construções sem recorrer aos sinais dos clientes, ajudou a repor de imediato a confiança tendo sido demonstrado que os pressupostos não tinham sido alterados. Neste momento estamos a tentar lidar com o impacto ainda imprevisível que todo este momento irá ter no futuro. Se já lidamos com elevados níveis de imprevisibilidade na promoção imobiliária, neste momento este tema torna-se ainda mais relevante. Em termos de vendas tivemos apenas uma desistência de um cliente num projecto em Lisboa.

O ciclo de vida dos projectos de promoção imobiliária é muito longo e, no nosso caso, estamos desde o primeiro dia até às escrituras sem receitas recorrentes. Isto significa que temos que ter a estrutura de custos dos projectos integralmente provisionada desde o dia zero, independentemente das condições económicas, percentagem de vendas ou qualquer outro factor. O verdadeiro impacto está guardado para o final dos projectos pois é quando realmente verificamos em que medida as nossas projecções e pressupostos se verificaram.

As obras dos novos projectos não pararam?

Conseguimos conjuntamente com os empreiteiros implementar medidas de segurança sanitária e de prevenção de forma a que fosse possível, e seguro, continuar as obras dentro da normalidade possível e de acordo com as recomendações da DGS.

Com estas medidas conseguimos não interromper nenhuma obra e a quebra de produtividade foi marginal.

Como têm decorrido as vendas?

Continuamos a ter muita procura para os nossos projectos por parte de clientes nacionais e internacionais, sendo que conseguimos inclusivamente realizar vendas nos últimos dois meses. A nossa percepção é de que o interesse e a procura efectiva se mantêm, apesar de o discurso por parte de alguns dos potenciais compradores se ter alterado. Passaram de aceitar os valores de mercado como sendo uma realidade, para estarem agora expectantes de que irão aparecer boas oportunidades advindas de uma descida generalizada nos preços do imobiliário. É natural que assim seja, é do conhecimento geral que os climas de incerteza e as crises económicas e sociais tradicionalmente são os melhores momentos para realizar boas aquisições.

Vão manter os investimentos previstos para 2020?

Vamos manter todos os projectos que tínhamos previstos para os próximos anos. Sabemos que eventualmente iremos atravessar um período mais complicado, mas não podemos parar de trabalhar. Teremos certamente que adoptar estratégias diferentes para ultrapassarmos novas realidades que se irão impor, mas parar não é uma opção. Não o podemos fazer por nós e não o devemos fazer por todas as pessoas e empresas com as quais colaboramos diariamente. É fundamental que as empresas que têm capacidade financeira continuem a fazer os seus investimentos, a pagar os créditos, as rendas e os ordenados, a adjudicar novos trabalhos aos seus fornecedores de forma a que todos possamos compensar as perdas já muito avultadas registadas nos últimos dois meses e as que ainda estão para vir.

Como vê o futuro do mercado imobiliário em Portugal? As previsões apontam para descida dos preços, é da mesma opinião?

Considero que há alguns cenários possíveis em cima da mesa, mas de momento ainda é tudo muito incerto.

Acredito que possa ocorrer uma correcção temporária nos preços decorrente dos impactos económicos que este momento irá ter directamente nas famílias e nas empresas. Vejo esta correcção a ter mais impacto fora dos centros de Lisboa e Porto, pois considero que os compradores estrangeiros vão continuar a investir, desde que os programas que os estavam a canalizar para Portugal não terminem.

Por outro lado, sabemos que temos uma enorme dependência do Turismo e de todos os seus serviços complementares, e que por isso, só conseguiremos determinar com alguma precisão o comportamento do mercado quando percebermos a que velocidade e em que condições estes mercados se vão normalizar, pois o seu contributo para a economia é muito grande. É previsível que haja uma recuperação conjunta destes sectores.

Vejo também que alguns destinos como o Algarve possam ter incrementos significativos na procura, pois têm condições excepcionais para oferecer a famílias que pretendam mudar-se para locais com menor densidade populacional, onde possam trabalhar remotamente, de forma segura e com muita qualidade de vida, beneficiando do clima e de todas as infraestruturas existentes.

Nesta crise Portugal tem passado uma imagem positiva no exterior, acredita que no futuro isso pode ser benéfico para o mercado imobiliário português?

Creio que a imagem positiva que tem estado a ser transmitida para o exterior através dos media, poderá ter claramente um efeito benéfico para toda a economia Portuguesa. Esse trabalho tem estado a ser muito bem feito e acredito que será capitalizado com confiança mais tarde. É importante advertir para o facto de a comunicação ser apenas o primeiro passo. Não podemos iludir-nos pois há muito trabalho de fundo a ser feito e muitos erros a serem corrigidos. Vamos ter que enfrentar novas problemáticas todos os dias, mas temos todos os agentes económicos com mais vontade do que nunca em contribuir para a aceleração da retoma. Cabe ao estado o papel de contribuir para a estabilidade e previsibilidade do sistema económico, através de medidas rápidas, eficazes e previsíveis, que dêem resposta às necessidades de cada um dos sectores.

Estamos apenas numa boa posição no início da corrida, mas para todos os efeitos, neste aspecto estamos em vantagem.