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Onde vai parar o arrendamento em Portugal, senhores governantes?

30 de março de 2020

Nos últimos dias, por força das circunstâncias provocadas pelo Covid-19 (Coronavirus), o país viu-se forçado a parar, para entrar em quarentena. Com essa quarentena, veio o Estado de Emergência, decretado pelo Presidente da República, no qual as actividades económicas foram reduzidas a mínimos históricos.

Ouvimos o senhor Primeiro Ministro (PM) a anunciar, no passado dia 20 de Março, um conjunto de medidas económicas, que visam debelar impactos causados na sociedade, tais como o adiamento do Pagamento Especial por Conta, adiamento do pagamento do IVA e do IRS para o 2º semestre de 2020.

Também foi declarado que, durante o Estado de Emergência, seria impossível cessar contratos de arrendamento, bem como proceder a despejos. Os senhorios foram também envolvidos nesta missão de salvação nacional, mas ficaram algumas perguntas por responder.

A primeira pergunta é: “O que vai acontecer com o pagamento do IMI, agora em Abril/Maio?” É uma prestação obrigatória para todos os proprietários de imobiliário e nada foi dito. Pior ainda, com a proposta de lay-off simplificado para as empresas, apresentada pelo PM e pelo Ministro da Economia, vamos verificar uma perda de rendimentos para os trabalhadores.

Como será de esperar, o efeito de contágio não se tardará em fazer sentir. Quando um inquilino vê o rendimento a ser reduzido, vai aguentar a renda, até não a conseguir pagar, ou a deixar atrasada. Portanto, há um sério risco de haver uma redução de rendimentos dos senhorios, já em Abril/Maio. Mais ainda, se for arrendamento comercial, o risco ficará bem mais sério, pois temos muitos negócios encerrados e, os que se aguentam abertos, estão com perdas na ordem dos 50 a 60%, tal como anunciou recentemente, por exemplo, um dos sócios-gerentes da Padaria Portuguesa.

Sabemos também que alguns proprietários são fundos imobiliários, mas há muitos milhares que são pessoas individuais que herdaram as casas/lojas de familiares e, a meu ver, não poderão ser esquecidos, pois ser proprietário não é sinónimo de ser rico, como algumas forças políticas procuram apregoar. É, sim, sinónimo de muitos encargos com obras, para renovar o parque imobiliário de décadas com rendas congeladas, e de impostos a pagar ao Estado, como o IMI e a taxa liberatória sobre as rendas, de 28%.

Portanto, tal como foram anunciadas medidas de alívio fiscal, durante este período de Estado de Emergência, também seria importante não esquecer um dos maiores contribuintes estatais anualmente, com o pagamento de IMI: senhorios.

A segunda pergunta é: “Que medidas de protecção é que o Estado pretende aplicar, caso os inquilinos entrem em incumprimento?”

É uma pergunta importante e que ainda não há uma única resposta por parte dos governantes. Parecendo que não, deveria preocupar todos, pois há um pagamento de imposto sobre as rendas recebidas, de 28%. Ao receber menos rendas, há uma dupla quebra de rendimento: nos senhorios e no Estado.

Mas, o cenário mais preocupante, será o flagelo social que será gerado. Ao entrar em incumprimento, o inquilino põe-se numa situação vulnerável perante o senhorio, pois continua a viver no locado, com ausência de pagamento da renda. O senhorio poderá fazer a sua protecção social, mantendo o inquilino no locado, não o despejando, mas isso cria um cenário de vulnerabilidade económica e social que, a meu ver, só teria uma solução: envolver o Estado.

Assim como foram criadas linhas de crédito para as empresas, para garantir que estas não fechem nem extingam postos de trabalho, também seria pertinente criar uma linha de crédito, a juro baixo, para os inquilinos que se vissem em risco de incumprimento. Só assim se evitaria uma destruição de rendimento dos inquilinos, bem como dos senhorios e, em última instância, do próprio Estado.

Seria um Win-Win, pois o Estado não perderia dinheiro, pois iria reavê-lo sob a forma de impostos, do lado do senhorio e, mais tardiamente, sob a forma de juros, por parte do inquilino.

Mas, enquanto não aparecerem medidas mais concretas e visíveis para proteger o arrendamento, por parte do Governo, as dúvidas vão continuar a persistir e os senhorios farão protecção social aos contratos que se encontram a cessar, com todos os riscos que poderão advir daí, pois foram obrigados, por decreto-lei.

Para concluir, e observando a ausência de respostas governamentais, fica no ar a seguinte questão: “ Onde vai parar o arrendamento em Portugal, senhores governantes? “

Emanuel Sousa

Engenheiro / Gestor e Vogal da Habitação da Juventude Popular Lisboa