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Opinião

 

Lisboa Reabi(li)tada

21 de setembro de 2018

E daqui a 20 anos. Como serão os postais de Lisboa?

Naturalmente, não queremos uma cidade sem a identidade arquitetónica que a distingue de todas as restantes capitais europeias, mas certamente não queremos uma “cidade só de fachada”.

Ou seja, apesar de o período ser marcado por um maior positivismo económico, acompanhado pelo chamado “boom imobiliário”, é fundamental que nós, profissionais da área, não nos esqueçamos da nossa responsabilidade na requalificação do habitar Lisboa.

É certo que se trata de um desafio, numa cidade com espaços tão heterogéneos e fragmentados, encontrar simultaneamente a integração na imagem tradicional e uma resposta às exigências do habitat contemporâneo. A reabilitação é uma intervenção que vem equilibrar uma soma de gerações, ora construtivas e arquitetónicas, ora na vivência dos espaços e definição de bem-estar.

Construtivamente e metodologicamente os desafios da reabilitação são diversos e singulares.  Este tipo de intervenção pressupõe sempre condicionalismos que advêm de circunstâncias preexistentes.

Já nos deparámos com modelos de reabilitação do tipo reconstrução/reprodução, com a premissa de preservar o património arquitetónico, desde a fachada aos mais pequenos pormenores de interiores que constituam o ícone de um tempo arquitetónico. Nestes casos, o objetivo é manter as características morfológicas do edifício, garantindo que não se verificam alterações ao seu carácter, salvaguardando os valores de relação com a rua e o espaço envolvente. É como polir uma pérola esquecida e dar-lhe brilho novamente. O mais frequente, no entanto, acaba por ser a transformação de edifícios devolutos, aos quais se pode ainda adicionar a alteração de uso. Nestes casos deparamo-nos com edifícios pontuados por muitas carências estruturais, outras vezes são o resultado de um somatório de intervenções ao longo do tempo, resultando numa sucessão de espaços sem coerência formal ou até estrutural. Construídos numa época em que a regulamentação e o controlo de fiscalização eram menos exigentes, apresentam, por isso, hoje, a necessidade de um acompanhamento muito próximo e cauteloso ao nível de projeto e obra. Nestas intervenções o acompanhamento em fase de projeto e obra é também muito exigente, iniciando-se com uma due diligence técnica profunda de forma a conhecermos em detalhe o edifício. Frequentemente estas operações de reabilitação são mais onerosas do que construção nova.

Aqui a metodologia de intervenção deve ser a requalificação do espaço, interior e exterior. Mas é necessário ver além das diretrizes regulamentares. Os projetos precisam de qualidade e excelência, potenciando, assim, a qualidade arquitetónica do edifício, numa perspetiva de bem-estar para quem o habita, e numa perspetiva de adequação à morfologia da cidade. É obrigatório, segundo a nossa ótica, que estas intervenções nas preexistências da cidade, num processo de substituição e renovação de peças, no puzzle que é Lisboa, façam sonhar e sejam o reflexo da Lisboa do futuro.

E daqui a 20 anos. Como serão os postais de Lisboa? Esperamos que mantenha a sua identidade, com equilíbrio entre o que era, e o que será. Uma cidade bonita, mas, acima de tudo, sustentável e continuamente reabi(li)tada. 

Sara Carnide

Arquiteta Louvre Properties

*Artigo escrito segundo novo Acordo Ortográfico