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O Arq.º Leonel Fadigas fala-nos das “Alfaces na avenida…”

9 de novembro de 2017

O arquitecto Leonel Fadigas é um dos autores, e também editor, do livro 'Alfaces na avenida. Estratégias para (bem) alimentar a cidade', recém-editado.

O livro resulta do trabalho desenvolvido pelo Colégio Food, Farming and Forestry (F3) da Universidade de Lisboa e aborda as questões do planeamento alimentar urbano como um desafio societal resultante das múltiplas transformações económicas, demográficas, tecnológicas e culturais no âmbito das questões relacionadas com o uso e ordenamento do território, bem como o direito à alimentação, a organização da produção e comercialização de alimentos e da sua segurança.

O Diário Imobiliário falou com Leonel Fadigas, personalidade ímpar no meio académico, imobiliário e figura respeitada no meio da arquitectura paisagista.

Natural de Alcobaça, Leonel Fadigas tem um percurso longo e diversificado. Licenciou-se em Arquitectura paisagista pelo Instituto Superior de Agronomia de Lisboa e foi Professor na Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa. Exerceu a actividade profissional como arquitecto paisagista e urbanista entre 1972 e 2010. Foi director e presidente da AMBELIS, Agência para a Modernização Económica de Lisboa, SA (1996-2003) e presidente do Conselho de Impacte Ambiental da EPAL (2000-2003).  Deputado à Assembleia da República entre 1981 e 1987, presidiu à Comissão Parlamentar de Equipamento Social e Ambiente de 1983 a 1985, tendo sido um dos responsáveis pela elaboração da Lei de Bases do Ambiente.

 1.    Como nasceu a ideia do livro?

As sociedades contemporâneas, e a nossa não é excepção, se confrontam-se com problemas que as alterações climáticas acentuam, nos domínios da alimentação, da agricultura e da floresta. Neste quadro, o Colégio Food, Farming and Forestry (F3) da Universidade de Lisboa reconhecendo que estes desafios exigem uma ampla diversidade de saberes existentes nas unidades orgânicas da Universidade de Lisboa, no seguimento dos seminários já realizados, deu corpo a este livro como contributo para a ampliação da discussão sobre estes temas. Aproveitando o conhecimento e a investigação que sobre estas matérias tem vindo a ser realizada na Universidade de Lisboa.

 2.    Está subjacente o problema real que é o de alimentar as cidades… Que principais problemas se colocam, nestes tempos de superprodução industrializada, problemas ecológicos e de saúde pública?

Os principais problemas são a disponibilidade alimentar, a sua segurança e as condições da sua produção, em termos de resposta às novas realidades económicas e sociais e ao efeito que as alterações climáticas estão a ter na produção agrícola e florestal.

Num mundo de produção alimentar industrializada, na produção, no transporte, no armazenamento e na distribuição, o peso da energia é elevado, como o é o consumo de água, concorrendo para o acentuar dos problemas ambientais. E isto pode ser alterado sem reduzir a indispensável capacidade de produção alimentar mesmo num quadro de agricultura intensiva. Aproximando as áreas produtivas dos centros consumidores, optimizando as redes de distribuição e aumentando a segurança alimentar.

 3.    Até que ponto esta questão pode vir a influenciar o urbanismo das cidades e, nomeadamente das grandes metrópoles?

Este novo desafio imposto pela exigência de um planeamento alimentar seguro e adequada às necessidades da sociedade, em termos de igualdade de direitos, acaba por ter efeito sobre o ordenamento do território e o planeamento urbano. Os paradigmas de referência tradicionais revelam-se ineficientes para o efeito, o mesmo acontecendo aos instrumentos de ordenamento territorial (PROT, PDM e planos de urbanização). As tragédias dos últimos meses com a grande vaga de incêndios que assolou o país mostram, pelas suas consequências, que o ordenamento do território que se lhe deve seguir deve ter uma atenção muito cuidada às questões do uso ligada à produção alimentar e ao suporte que a deve permitir. O mesmo se passa com a utilização agroflorestal dos solos deixados livres pela urbanização, especialmente nas áreas metropolitanas. O mesmo acontecendo com o facto de não existirem solos da reserva agrícola nacional dentro dos perímetros urbanos o que, a não ser assim, se poderia dispor de um conjunto de solos de proximidade para produção alimentar, na forma de agricultura tradicional ou na de hortas urbanas.

 4.    Há quem encare estas questões como improvisos diletantes de bem-intencionados… Até que ponto a questão é séria e coloca a questão premente de mudanças, de mentalidades, de hábitos, de maneiras de viver?

A rapidez com que se assiste à alteração das nossas paisagens e dos modos de produção, transporte, armazenagem e distribuição dos produtos alimentares e o acentuar das desigualdades sociais no seu acesso, mostra que alguma coisa tem de ser feita. A investigação e a reflexão que o Colégio F3 da Universidade de Lisboa tem em curso, procura, com seriedade, dar uma resposta adequada às questões que, nesta matéria, se colocam à sociedade contemporânea. Até porque o direito à alimentação, implica qualidade, disponibilidade e segurança.

As circunstâncias concretas do nosso tempo impõem realismo na abordagem destas matérias e mostram com isso é indispensável. O tempo está a ajudar a confirmar isso.

 

Leia o livro AQUI