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Arquitectura

 

 

 

 

 

 

"A beleza é o auge da funcionalidade!" – Álvaro Siza Vieira

26 de janeiro de 2017

Em entrevista a Vladimir Belogolovsky para o website ArchDaily o arquitecto Álvaro Siza Vieira revela-se e ao seu trabalho, que conta já com 60 anos percurso.

Nesta entrevista, a mais recente da série "City of Ideas" de Vladimir Belogolovsky, Siza discute essas tentativas de categorizar seu trabalho, a sua abordagem ao projecto e o papel da beleza nas suas obras.

 

Tradição e influências

Um dos temas interessantes da entrevista é a reflexão sobre ‘tradição’ e ‘influências’. Álvaro Siza Vieira afirma: “Tradição não significa fechamento, imobilidade. Muito pelo contrário, o valor das tradições é estar aberto a inovações. A tradição não é o oposto da inovação, ela é complementar. A tradição vem de intercâmbios sucessivos. As culturas isoladas que tentam preservar suas tradições sem estarem abertas a novas ideias desmoronam. Toda a cultura tradicional é influenciada por culturas externas. Quando eu estava crescendo na profissão, havia muito poucos centros de cultura global - Paris, Londres, Nova York - , e o resto era uma periferia. Portugal estava na periferia e ficou fechado até a revolução de 1974, somente após essa data o país foi redescoberto. Frampton foi um dos primeiros críticos que vieram aqui e viajaram para outras partes da Europa, incluindo Espanha, Grécia e países escandinavos. Foi o momento em que os arquitectos estavam interessados em redescobrir a arquitectura não-convencional. Neste contexto, ele foi, talvez, o primeiro crítico que insistiu na importância da identidade…”.

Siza sublinha a Vladimir Belogolovsky que  “É impossível fazer algo inteiramente novo. (…) O novo só vem por meio de novas combinações e materiais, mas nada é completamente novo. Nós, arquitectos somos constantemente influenciados pelo que está à nossa volta” - afirma.

 

Obsessão pelo desenho…

“Começo a desenhar desde o início. Não me preocupo com a análise do problema, as condições do terreno ou mesmo o programa. Porque se eu fizer primeiro toda a análise haveria muita informação e pouca arquitectura...” – afirma perentório. E adianta: “Primeiro, eu esboço, às vezes antes de visitar o local. Isto acontece porque eu começo a trabalhar imediatamente à procura de uma ideia, mesmo se eu tiver apenas uma foto do lugar. E na maioria das vezes os primeiros esboços são inúteis. Mas eu uso-os para construir uma ideia que sai de muitos esboços. Gradualmente, com mais informações, uma coisa real emerge. Eu trabalho sempre com colaboradores que me alimentam com informações. Eu trabalho directamente com modelos e em algum ponto, há um cruzamento entre o rigor que vem da informação precisa e a liberdade completa da minha intuição, eles se encontram…”. “Há uma relação entre a mão e a mente. Um complementa o outro. Aalto também falou sobre isso” - acrescenta.

 

O arquitecto universal: tantos países, tão diferentes culturas, tanta diversidade de materiais

“Não acho que tenha uma linguagem unificada – diz Siza. Trabalhei em Portugal e Espanha, na Itália, Alemanha, Suíça, Brasil, China ... São circunstâncias muito diferentes. As técnicas de construção são diferentes. Os materiais são diferentes. As condições climáticas são diferentes. Histórias e culturas são diferentes. As atmosferas são diferentes. Minhas decisões são baseadas no que eu observo e absorvo. (…) Assim cada edifício é uma resposta a circunstâncias específicas e eu não tenho uma teoria estrita. Claro, eu tenho uma teoria, caso contrário como eu poderia ter uma prática? Mas essa teoria não limita meu trabalho.

A entrevista, bem-humorada, tem uma parte cómica e, simultaneamente, profunda. Vladimir Belogolovsky provoca: “Você disse uma vez: "A beleza não me interessa." No entanto, seu trabalho é muito bonito. Qual é a intenção principal, então?

“Eu disse isso?” – Interroga-se surpreendido Siza Vieira. E acrescenta: “Eu só poderia dizer isso se estivesse bêbado. [Risos.] Claro que estou interessado em beleza. A beleza é o auge da funcionalidade! Se algo é bonito, é funcional. Não separo beleza e funcionalidade. A beleza é a chave da funcionalidade para os arquitectos... Gostaria de saber como poderia dizer que a beleza não era de meu interesse... Talvez alguém me tenha provocado dizendo que eu sou um esteta. Eu não o sou. Mas a busca pela beleza deve ser a preocupação número um de qualquer arquitecto. 

Ainda a propósito dos esboços e croquis que sempre antecedem qualquer novo projecto de Siza Vieira, o arquitecto valoriza o trabalho de equipa. E diz: “ Envolvo a minha equipa desde o início. Os engenheiros, por exemplo, começam imediatamente. O que eu não gosto agora é quando os arquitectos mais jovens começam a trabalhar em projectos imediatamente no computador. Isso não lhes dá a chance de iniciar o projecto com o pensamento livre e desenhos à mão livre. Ideias novas vêm do pensamento e do desenho e não do computador. Esboçar é importante para pensar”.

“Os computadores tornaram possível projectar e construir a arquitectura de forma muito mais rápida. Mas pensar ainda leva tanto tempo. Arquitectura é um debate e uma provocação; Isso não pode acontecer sem se pensar. Os computadores podem melhorar o pensamento, mas a arquitectura é uma arte lenta” – diz Siza Vieira.

 

Vladimir Belogolovsky

Vladimir Belogolovsky é o fundador da organização sem fins lucrativos sediada em Nova York, Curatorial Project. Formou-se como arquitecto na Cooper Union em Nova York, tendo escrito variadíssimos livros sobre arquitectura É o correspondente americano da revista de arquitectura, com sede em Berlim, SPEECH.

A coluna de Belogolovsky, City of Ideas, apresenta aos leitores do ArchDaily as suas conversas recentes com os arquitectos mais inovadores de todo o mundo.

 

Leia AQUI toda a entrevista.