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Segunda casa? Não obrigado!

11 de fevereiro de 2015

Assistimos nos últimos anos a uma mudança de paradigma na forma como os europeus olham para a segunda casa, com sérias consequências para a actividade imobiliária e turística no nosso país.

Visto durante muitos anos como o sonho seguinte à compra da primeira casa, a aquisição de uma segunda casa, facilitada pelos anos de crédito abundante, fácil e barato, gerou importantes oportunidades de negócio para os países do sul da Europa, em especial para a nossa vizinha Espanha.

Os nossos irmãos descobriram cedo este potencial de exportação e investiram fortemente na imagem do seu país, enquanto destino de sol, praia, golfe, história e touradas. Apesar das suas características únicas, não se preocuparam em promover especificamente qualquer das suas regiões (como nós erradamente fizemos com o Algarve) concentrando assim todo o esforço e orçamento disponível numa única marca que fosse verdadeiramente global e marcante: Espanha!

Era muito raro folhearmos a edição europeia das revistas Time e Newsweek sem encontrarmos um anúncio à marca Espanha, ao lado das grandes multinacionais de tabaco, álcool, banca ou aviação. Perguntei-me muitas vezes que sentido fazia a publicidade a um país, mas hoje percebo e admiro a forma como se anteciparam e posicionaram como destino preferencial de turistas e reformados. Em resultado desta política, a sua indústria do turismo e imobiliário cresceram consideravelmente, tendo sido vendidas nestes anos mais de um milhão e meio de casas a estrangeiros, um pouco por toda a Espanha, da Múrcia à Andaluzia.

Em Portugal acordámos tarde para esta oportunidade. Apesar dos fortes e diferenciadores argumentos de venda que poderíamos ter utilizado para promover o nosso país, nunca concentrámos verdadeiramente os nossos esforços e curtos orçamentos na promoção da nossa única marca assinalável: Portugal. Tentando sempre agradar aos autarcas de cada região deste pequeno país, dividimos o nosso parco investimento na promoção do Douro, do Alentejo, do Oeste, do Algarve ou do Alqueva, sem nunca percebermos que à dimensão mundial ou europeia qualquer destas marcas jamais se conseguirá afirmar por si só.

Juntando a isto alguma falta de espírito de risco e dimensão dos empresários e bancos portugueses, a excessiva burocracia no licenciamento de resorts turísticos e ainda a falta de políticas orientadoras para o sector por parte da governação, perdemos os anos de ouro do turismo residencial e a oportunidade de nos afirmarmos enquanto destino de excelência nesta matéria, como prova o facto de termos um número de casas detidas por estrangeiros cerca de 30 vezes inferior à nossa vizinha Espanha.

Será que ainda vamos a tempo de recuperar este atraso? A minha opinião é que não, pois a forma como os europeus olham para a segunda casa mudou radicalmente nos últimos anos, provavelmente para sempre.

Senão vejamos: As principais motivações que levavam um cidadão a optar por comprar uma segunda casa num destino turístico eram as seguintes:

  1. Usufruto – tempo de utilização em férias com a família
  2. Rendimento – receita da exploração turística em alternativa a um depósito a prazo
  3. Investimento – probabilidade de valorização do activo ao longo dos anos 

Hoje sabemos que o Rendimento nunca acontece, devido à sazonalidade deste tipo de destinos e às comissões cobradas pelos agentes e entidades exploradoras. Se conseguirmos gerar rendimento suficiente para fazer face aos custos anuais de condomínio e de propriedade já nos podemos dar por muito contentes.

Também já não vemos a segunda casa como um Investimento que se valoriza no tempo, pois o excesso de oferta em quase todos os segmentos e zonas turísticas gera uma pressão permanente sobre os preços, causando muitas vezes uma depreciação do valor dos activos.

Resta-nos assim o Usufruto, que para a grande maioria dos cidadãos, não passa de um mês por ano.

Fará então sentido comprarmos uma segunda casa apenas pelo seu usufruto, sabendo que nos vai dar trabalho e custos todo o ano, para apenas a utilizarmos numas escassas semanas de férias? E com tantas opções que temos hoje de alojamento de qualidade, em diferentes destinos e países, com voos cada vez mais baratos e seguros, vamos obrigar a nossa família a ir sempre para o mesmo local, só porque em tempos comprámos lá uma casa??

Se formos racionais dizemos que não. É hoje mais barato e sabe bastante melhor alugar uma casa num destino variado, ou optar por ficar num hotel de luxo, do que comprar e manter uma segunda casa.

Aposto assim no ressurgimento e crescimento das soluções de propriedade e usufruto partilhado, como são o time-sharing, o fractional ownership e os vacation clubs. Fazem hoje mais sentido do que nunca, ora consigamos alterar a nossa mentalidade de proprietários exclusivos e teimosos.

Se assim não for, resta-nos escoar o stock acumulado de turismo residencial com os reformados do norte da Europa, se soubermos vender o nosso país como um local ideal para passarem o resto dos seus dias, com boa luz, calor, excelente comida e segurança. Mas nesse caso já não estamos a falar de segundas casas, mas sim de primeiras.

J.L. Pinto Basto
CEO | The Edge Group