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Os imóveis queimados

8 de setembro de 2020

Não vos chateia ter acesso a imóveis que sabemos que são, à partida, queimados, porque há quem aceite angariar a preços que os próprios sabem estar acima do valor do mercado, mas fazem-no à mesma para garantir a angariação (ou para não contrariar a vontade do proprietário)?

Todos nós já passámos por isto, quanto mais não seja uma vez na nossa vida imobiliária. E todos sabemos o resultado prático desta estratégia. Ou ficamos com um nado morto entre mãos – porque ninguém visita este imóvel ou faz, sequer, uma oferta – ou acabamos por enfraquecer a nossa posição como profissionais do ramo quando, uns meses mais tarde, com o imóvel parado, temos a conversa com o proprietário para que este aceda a reduzir o valor do imóvel. E pelo meio, ainda pedimos ajuda ao sector para uma verdadeira missão impossível.

Este pesadelo só acaba no dia em que, por milagre, alguém aparece com uma proposta (muito raro) ou então, quando o proprietário nos livra deste peso morto que temos entre mãos ao denunciar o contrato que mantivemos até então. Uma decisão que afecta não apenas o nosso bom nome e, por arrasto, o bom nome da empresa que representamos.

Em qualquer um dos casos, são situações evitáveis, que poderiam ser travadas ad initium, até porque, como sabemos, remendar uma coisa malfeita nunca dá bom resultado.

Se, no acto de angariar o imóvel, fosse explicado ao cliente que o valor que está a ser pedido está acima do mercado – com estudos concretos, com uma análise profissional e não com meros achismos -  tenho a certeza que se precaveria todo este caminho das pedras e não teríamos também de ter, meses mais tarde, a conversa com o cliente sobre reduzir valores – sabemos que, por norma, o cliente não o quer fazer e acha que, se tirar 5 ou 10 mil euros já nos está a fazer um enorme favor. E esta descida, como também sabemos, raramente coloca o imóvel a preço. Ou seja, não resolve nenhum problema e fragiliza a nossa posição.

E o que fazer quando o cliente volta a nós, depois de nos ter recusado porque foi enfeitiçado com a frase “eu tenho um cliente para o seu imóvel” (quem nunca?) e passado uns meses descobre que afinal não é bem assim? Se correu bem e é verdade, toda a gente fica feliz (menos nós que aparentemente fizemos uma análise errada do mercado). Mas basta uma vez que assim não seja para que exista um problema: para o cliente e para a credibilização do sector.

Por outro lado, se o cliente contrata pela segunda vez outra agência e outro consultor, mantendo a ideia de preço como se nada se tivesse passado, está já a por em causa o nosso trabalho e a nossa competência. E, se a segunda escolha somos nós, e para angariarmos o imóvel cometemos o mesmo erro do primeiro consultor, acabamos por prolongar este erro.

Num mundo ideal, nós nunca aceitaríamos, à cabeça, imóveis queimados. E, já agora, neste cenário idílico, teríamos igualmente coluna vertebral para não aceitarmos ser segundas escolhas.

Francisco Mota Ferreira

Consultor Parcial Finance