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Abre-te Património

11 de fevereiro de 2015

O património existe para ser fruído, penso que isso é um conceito consensual, se assim não for perde muita da sua razão de existir e de ser mantido em boas condições. Tradicionalmente, em Portugal temos uma visão algo fundamentalista do património, seja natural, seja edificado. Existe a noção enraizada de que a melhor forma de preservar o património é fechá-lo, escondendo as suas chaves (a sete chaves) numa gaveta com segredo, para que ele possa continuar como está protegido dos “vândalos” que o querem usar. Essa é muito a visão do Estado e as demais instituições que possuem ou cuidam de património classificado, com honrosas excepções. Por vezes as entidades e pessoas que gerem património esquecem-se que ‘Ele’ não é seu, e que, como diz aquela deliciosa publicidade da Patek Philippe, devem apenas guardá-lo até à chegada da geração seguinte. Defendo que essa atitude proteccionista está a condenar lentamente os nossos bens culturais.

Um dos exemplos mais concretos do que digo teve a ver com um projecto no qual colaborei, pro bono como deve ser nestes casos, e que se propunha a melhorar as condições de visitação dos Parques Nacionais e das demais zonas protegidas do nosso país, que estão debaixo da alçada do ex-ICN, ex-ICNB e actual ICNF (nenhum país no mundo muda tanto o nome das suas instituições públicas como o nosso). Foi um ano de trabalho entre a Associação da Hotelaria de Portugal, o ICNB e o Turismo de Portugal, do qual saiu um extenso documento que dava centenas de ideias de medidas a tomar nesse sentido. Ao que sei, esse documento nunca saiu da secretária do Secretário de Estado (perdoem-me o pleonasmo), não porque não fosse válido, apenas porque provavelmente daria trabalho implementar e iria quebrar algumas barreiras no acesso ao “NOSSO” património. Perderam os portugueses e os turistas que nos visitam.

Nesta época de crise o Estado está descapitalizado e não irá seguramente investir no património. Mas talvez existam privados que o queiram fazer. O desemprego grassa e temos algum potencial, turístico e não só, a ser desaproveitado. Seguramente existem oportunidades para jovens empreendedores, para empresas privadas, para estrangeiros que possam investir no nosso património e não apenas nas nossas indústrias (o que não estão de qualquer forma a fazer). É preciso ter a coragem de abrir o património, de o arrendar a custos controlados, de o ceder a quem possa fazer melhor uso dele. Nunca me esqueço que a minha família teve nas suas mãos durante 150 anos (desde a venda em hasta pública dos bens das ordens religiosas até aos anos 70 do século passado) um mosteiro medieval que se foi degradando por incapacidade de investidor. A certa altura tivemos a abertura de espírito de o vender ao Estado, que conseguiu recuperá-lo como nós não conseguiríamos nunca fazer. É a mesma ‘desabnegação’ que agora se exige a quem tem património que não sabe ou não consegue cuidar, que busque alternativas para o colocar nas mãos de quem pode e quer, para bem dos actuais mas também dos que virão.

Miguel Júdice
Presidente, Thema Hotels