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Sustentabilidade o mote para conquistar mercados

11 de fevereiro de 2015

É no dia 30 de Maio que se realiza o 17º Congresso da APCMC – Associação Portuguesa de Comerciantes de Materiais de Construção e em simultâneo a Conferência Internacional sobre a Reabilitação e a Construção Sustentável.

José de Matos, secretário-geral da APCMC em entrevista ao Diário Imobiliário revela que a reabilitação urbana e a renovação particular têm sido o motor dos materiais de construção nos últimos tempos.

Qual a estratégia do sector para superar a crise dos últimos anos na Construção?

É importante começar por dizer que esta “crise” não é, como algumas anteriores, meramente conjuntural. Além disso é muito mais profunda e foi acompanhada por alterações do contexto económico que afetaram as empresas de todos os setores de atividade.

Este diferente enquadramento pressupõe, naturalmente, respostas diferentes das habituais, assentes maioritariamente no controlo dos custos e ou no redimensionamento da atividade, ou mesmo na diversificação.

Assim, sem prejuízo do rigor da gestão, a estratégia das empresas tem assentado prioritariamente e consoante as suas possibilidades, em três eixos: no alargamento de mercados, internos e externos, no reposicionamento competitivo face à nova procura, em termos de clientes e de produtos, e na consolidação financeira.

Visto da forma mais convencional, as empresas têm vindo a fazer um caminho na área da internacionalização e a adaptar a sua estrutura interna e o seu portfólio de produtos e serviços a um mercado que se moveu da construção nova para as obras de renovação e reabilitação e dos clientes empreiteiros para os instaladores/aplicadores e mesmo para os clientes particulares.

A reabilitação tem sido a solução desejada para as empresas de materiais de construção?

A reabilitação, em sentido amplo, já é hoje em dia e sê-lo-á, cada vez mais, o mercado principal de destino das empresas de materiais de construção. A evolução deste segmento de mercado tem sido, todavia, muito lenta, por razões que se prendem, sobretudo, com o período de dificuldade financeira que o nosso país ainda vive.

Importa salientar que as operações de renovação e reabilitação são normalmente mais interessantes para as empresas de materiais de construção que a própria construção nova, uma vez que são mais intensivas em materiais com maior valor acrescentado, sobretudo materiais de acabamento e equipamentos.

Em todo o caso não devemos falar do mercado da reabilitação como uma solução para as empresas deste setor, mas sim como uma solução para os proprietários dos edifícios e uma solução para resolver necessidades de melhoria de condições de vida das famílias ou eficiência e conforto no caso dos edifícios ligados ao exercício da indústria, do comércio ou dos serviços, nomeadamente, os públicos. Para o nosso sector é uma oportunidade e um desafio a que temos que responder com soluções técnicas, logísticas e económicas adequadas.

E no que diz respeito à exportação como tem sido a evolução?

A exportação tem tido uma evolução positiva, sobretudo se considerarmos as circunstâncias, mas ainda há muito trabalho a fazer nesta área que, devemos reconhecê-lo, é muito difícil.

O sector dos materiais de construção sempre foi um dos setores exportadores mais importantes do nosso país, mesmo nos tempos áureos da construção. Quem não conhece os casos da cortiça, das rochas ornamentais, da cerâmica, das ferragens e até do mobiliário, entre outros?

Sucede que, como noutros sectores, o nosso mercado de exportação mais importante era Espanha, cuja “estouro” da bolha imobiliária foi o mais sonoro deste lado do Atlântico. Além disso a nossa competitividade externa, na maioria dos produtos e empresas do sector, estava muito assente numa saúde financeira das empresas que lhe era dada por um mercado interno muito dinâmico e por condições de financiamento favoráveis. Quando tudo isto acabou, e muito rapidamente, a nossa posição ficou comprometida e tornou-se muito difícil substituir quotas tão elevadas em Portugal e, nalguns casos, em Espanha, por outros mercados, ou totalmente novos, ou onde a nossa presença sempre foi incipiente por fraco reconhecimento das nossas marcas ou pelo obstáculo de cadeias de distribuição maduras e demasiado poderosas para poderem ser interlocutores das nossas empresas, normalmente pequenas.

É interessante constatar que, nestes mercados mais difíceis, tem sido um interveniente improvável, os comerciantes de materiais de construção, quem melhores resultados tem vindo a obter nos últimos tempos, alicerçando o seu sucesso na capacidade de atingir as linhas secundárias da distribuição ou mesmo o cliente final, através de uma oferta diversificada e complementar, e com uma logística muito flexível e um serviço personalizado.

Mas é fundamental conseguir subir na cadeia de valor e evitar que os nossos produtos sejam comparados exclusivamente pelo preço. Por isso, um dos objetivos que temos vindo a prosseguir é o de alcançar externamente o reconhecimento da qualidade do produto português, associando-o à reputação de excelência de que gozam a nossa engenharia e, sobretudo, a nossa arquitetura. Também foi essa a razão pela qual escolhemos como lema para a promoção externa da nossa fileira a frase “Excellence for Building from Portugal” o qual é também a base do argumento do filme promocional que vamos estrear no próximo dia 30 de maio durante a Conferência Internacional “ Reabilitação e Construção Sustentável – um desafio global”

O tema da conferência é a 'Reabilitação e Construção Sustentável'. Em que medida a construção sustentável é praticada em Portugal?

Por algo estranho que pareça, o tema da construção sustentável teve uma forte adesão em Portugal nos últimos anos, não só no meio técnico e da investigação, mas também na área empresarial e entre os promotores e donos de obra. Existe hoje uma vasta fileira que engloba não só projetistas e gestores de sistemas de avaliação de sustentabilidade, mas também fabricantes de produtos e equipamentos e que fazem da sustentabilidade o mote para inovar e conquistar mercados.

Talvez porque o sector da construção perdeu dinâmica e algum peso na economia e não tem recebido as atenções de que antes era alvo, há projetos realizados, há regulamentação a ser aplicada e há múltiplas iniciativas em curso que, eventualmente, estarão a passar algo despercebidas, mas que começam a mudar o paradigma.

Só a título de exemplo e para não falar de um vasto acervo de edifícios recentes, quer de habitação, quer de turismo, quer de serviços, que constituem referências de sustentabilidade, inclusive a nível internacional, pelo uso de produtos naturais e soluções construtivas inovadoras, devemos lembrar toda a evolução que foi feita, em particular, no âmbito da certificação energética dos edifícios que, mais recentemente, passou a incluir, também, a eficiência hídrica.

Mas, não precisamos de ir mais longe, a renovação e a reabilitação dos edifícios, ou mesmo a reabilitação dos próprios aglomerados urbanos que tem inerente alguma demolição é ela própria uma estratégia de sustentabilidade porque permite poupar/reutilizar os recursos materiais e os próprios solos já urbanizados.

Que impacto tem tido no mercado de materiais os sinais positivos do imobiliário e da construção?

Por enquanto, as empresas do sector, sem contar com as vendas no exterior que continuam a aumentar, têm registado, sobretudo, mais pedidos de orçamentos….

É verdade que nos últimos meses têm vindo a suceder-se os sinais animadores no setor imobiliário, sobretudo induzidos pela procura de imóveis no âmbito dos chamados “Visa Gold”, mas também por alguma animação no setor não residencial, sobretudo na área do turismo e dos serviços.

Mas tem sido a dinâmica de reabilitação que se tem feito sentir nas zonas históricas de Lisboa e Porto, de alguma forma relacionada com o incremento do turismo cultural, os cruzeiros e os chamados “city breaks” proporcionados pelas companhias de aviação “low cost”, bem como o número crescente de iniciativas de renovação, sobretudo de moradias, pelos particulares, os fatores de animação mais importantes no mercado dos materiais de construção e que têm contribuído para contrariar as quebras sucessivas na construção nova e da própria atividade de reabilitação mais profunda.

Mas, ainda que do lado das estatísticas da construção, seja ao nível dos indicadores da produção seja do licenciamento de obras, se tenha verificado uma tendência sustentada, desde o final do segundo trimestre de 2013 para abrandamento da recessão e, mais recentemente, para uma certa estabilização, a verdade é que a tendência ainda não se inverteu totalmente.

Todavia, face aos sinais já referidos e olhando para o recente crescimento do consumo de bens duradouros, em particular dos automóveis, parece poder deduzir-se uma diminuição dos constrangimentos financeiros e uma maior confiança dos consumidores, que esperamos se venha em breve a reflectir também ao nível da decisão de realizar obras de manutenção ou melhoria dos edifícios que foram adiadas nos últimos anos…

Finalmente há que assinalar a publicação recente do novo Regime Excecional da Reabilitação Urbana, no qual colocamos grandes esperanças para acelerar os processos burocráticos e viabilizar, do ponto de vista técnico e económico, a reabilitação dos prédios antigos.

Mas, sejamos sinceros, não haverá verdadeira retoma das atividades imobiliárias e da construção enquanto permanecerem as dificuldades económicas e as restrições de crédito induzidas pelo sobre endividamento das famílias e empresas e pelo peso excessivo de imóveis nos balanços dos bancos. A fiscalidade excessiva sobre os imóveis, nomeadamente as imperfeições da chamada tributação autónoma das rendas, constituem uma nova ameaça para a recuperação do valor dos imóveis e para a sua atratividade como investimento.