CONSTRUÍMOS
NOTÍCIA
Entrevistas

 

Planos de Pormenor são insipientes

11 de fevereiro de 2015

Numa altura em que tanto se fala da nova Lei dos solos, com a proposta apresentada no final de 2013 pelo Governo e aprovada no Parlamento, o Diário Imobiliário dá-lhe a conhecer o projecto PERCOM – A equidade e eficiência no processo de urbanização, financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia. Beatriz Condessa, coordenadora do projecto e professora Auxiliar da secção de Urbanismo, Transportes, Vias e Sistemas, Departamento de Engenharia Civil, Arquitectura e Georrecursos do Instituto Superior Técnico (IST), em entrevista explica a importância da aplicação da equidade no planeamento e no ordenamento do território. Um projecto onde o tema “Modelos de Financiamento de Operações Urbanísticas: Desafios e Oportunidades”, será apresentado no workshop que terá lugar no IST, no dia 28 de Janeiro de 2014 no IST.

Em que consiste o projeto PERCOM?

O projecto PERCOM – A equidade e eficiência no processo de urbanização, tem como objectivo investigar a aplicação da equidade no planeamento e no ordenamento do território, em particular nos planos de maior detalhe e, partindo dessa análise, apresentar propostas de modo a ultrapassar a falta de eficácia dos instrumentos previstos na legislação portuguesa, designadamente a perequação.

Para tal, até agora procurou-se, por um lado, conhecer a prática nacional no que respeita à elaboração, à execução de Planos de Pormenor e à adopção de modelos de perequação neste instrumento de gestão territorial e, por outro lado, conhecer as actuais práticas de financiamento bancário das operações urbanísticas. Naturalmente que estas duas tarefas foram complementadas e enriquecidas com o estudo de práticas internacionais nestas matérias, nomeadamente ao nível do enquadramento legal da perequação, dos modelos de gestão, do financiamento e da avaliação imobiliária.

De que forma a política de solos influencia o mercado imobiliário?

Num contexto em que o solo é preponderantemente de posse privada, a Administração Pública exerce, através das políticas de solos, do ordenamento do território e do urbanismo, uma influência ao nível da oferta do mercado imobiliário e do respectivo preço. Esta intervenção faz-se sobretudo através dos planos municipais que, ao regularem o uso do solo e a respectiva intensidade de uso, introduzem diferenças na valorização da propriedade imobiliária.

Este projecto poderá ser um instrumento para uma adequada revisão da lei dos Solos e das perequações?

Quando se realiza um projecto de investigação pretende-se que no final os resultados possam ser úteis à comunidade e a quem no “terreno” intervém ou decide nestes domínios e não produzir informação que não saia da academia ou que não é, na prática, exequível ou aplicável. Naturalmente que a nossa expectativa é de que os resultados possam contribuir para mudanças nas práticas instituídas no planeamento, na gestão e no ordenamento do território, o que pode implicar alterações legislativas. Realça-se, no âmbito da lei de solos e da legislação sobre perequação, o contributo do projecto ao nível da revisão do conceito de plano de pormenor, da redistribuição de encargos e de benefícios pelos diferentes proprietários e da proposta de um modelo de avaliação da propriedade imobiliária o mais objectivo possível.

Os planos de urbanização actuais são adequados e justos?

De entre os planos municipais de ordenamento do território, no PERCOM demos maior atenção aos Planos de Pormenor. Assim, da análise dos Planos de Pormenor publicados entre Outubro de 1999 e Dezembro de 2012 realizada no âmbito desta investigação, pode-se concluir que a adopção de modelos de perequação em Planos de Pormenor é uma prática pouco consolidada e os planos que os definem apresentam níveis de execução baixos, aquém do que seria expectável. Aliás, de um modo geral (prevejam ou não modelos de perequação), a execução destes planos é efectivamente muito incipiente, facto a que não será alheia a crise do imobiliário que atravessamos.

Além de um conjunto de alterações legislativas que torne o processo de elaboração técnica e de tramitação dos planos mais simples, os técnicos municipais entrevistados defenderam que um Plano de Pormenor só é eficaz quando há previamente garantia da sua execução, a qual deve ser assegurada e articulada previamente com todos os agentes (públicos e privados) envolvidos, para que não se proponha um plano cujo grau de execução será baixo ou nulo. Só assim se conseguirão planos mais eficazes, quer ao nível da execução, quer ao nível da prossecução do princípio da equidade.

Que inovações trazem este projecto?

Este é, desde logo, um tema oportuno, quando se cumpre mais de uma década sobre a previsão da perequação compensatória na legislação portuguesa e se discute a revisão de diplomas legais referentes ao ordenamento do território e ao urbanismo (alguns deles, já em estado avançado, como é o caso da Lei de Bases da Política de Solos, de Ordenamento do Território e de Urbanismo).

Destacam-se como principais inovações o reequacionamento da figura do Plano de Pormenor e da sua execução, merecendo especial atenção aspectos menos explorados, tais como a regulação dos procedimentos de avaliação da propriedade imobiliária, as condições de viabilidade financeira, as estruturas mais adequadas para gerir estes projectos e o processo de transferência de riscos das operações urbanísticas que concretizam os planos. Alguns destes temas serão abordados no workshop que vamos realizar já no próximo dia 28 de Janeiro de 2014 no IST.

Como se pode aplicar uma justa avaliação dos solos?

Essa é uma matéria que iremos trabalhar na próxima fase do projecto, mais propositiva. Os principais resultados esperados passam pela proposta de um modelo que assenta em três pilares fundamentais: a proposta de alteração ao enquadramento legislativo; a criação de modelos de avaliação da propriedade imobiliária; e, por fim, a criação de um modelo de financiamento e de gestão das operações de desenvolvimento urbano, que represente um menor risco para entidades financeiras, agentes privados e administração pública, e que garanta um maior grau de execução dos planos territoriais.