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“Internacionalização permitiu à empresa ultrapassar a crise”

4 de junho de 2018

O processo de expansão para a actividade internacional foi dos momentos mais marcantes da Construtora Casais, que os levou a repensar o modelo de negócio. Se não fosse este passo, confessa em entrevista António Carlos Rodrigues, a empresa poderia não ter sobrevivido.

Comemorar 60 anos de actividade, atravessando ciclos de crescimento e estagnação da economia, como foi o caso dos últimos anos, permitiram à Casais criar resistências para crescer e consolidar o seu crescimento?

A nossa actividade sempre foi e será baseada em projectos, o que exige uma grande flexibilidade no ajustamento às alterações da procura. Por outro lado, a actividade é desencadeada nos locais onde existe investimento, e por isso temos de estar constantemente a deslocalizar internamente os equipamentos e as pessoas. Com uma maior capacidade de mobilidade, as empresas conseguiram contrariar estas variações de mais e menos investimento com uma maior mobilidade. Uma maior mobilidade nossa também significa o mesmo para a concorrência. Se há 30 anos atrás não havia quase empresas espanholas em Portugal, essa deixou de ser a realidade nos últimos 20 anos. Uma postura de seriedade e honestidade marca a diferença a longo prazo. O foco em relações duradouras com os nossos clientes. Um cliente, para nós, não é um cliente de uma obra. Essa ligação às pessoas permite que, em tempos menos positivos, os clientes privilegiem trabalhar com quem tem laços de confiança. O activo das relações que são desenvolvidas e passam de geração é o maior activo de uma empresa. As relações, o carácter e cultura de uma empresa não são artigos que se encontram na prateleira do supermercado.

Quais foram os acontecimentos mais marcantes dos últimos dez anos?

Viver com as dificuldades gerais do país, da banca, dos parceiros. Quando não existe trabalho para todos, fica difícil o exercício da partilha. Não conseguir cobrar o trabalho pelo preço justo e sustentável torna impossível o exercício de manter uma empresa viva. Essa teria sido a conclusão mais óbvia caso a empresa dependesse apenas do mercado português. O processo de expansão para a actividade internacional foi dos momentos mais marcantes que nos levou a repensar no modelo de negócio.

A Casais actua em diversas áreas de actividade. Quais são os grandes desafios para a próximos anos?

Saber lidar com o processo da digitalização do negócio e da própria economia. E ultrapassar o desafio da falta de recursos humanos. Esse será o maior desafio dos próximos dez anos e marcará os dez seguintes. Tornar o sector mais atractivo para captar trabalhadores é um dos caminhos. Seguramente que uma maior qualificação da mão-de-obra faz parte desse processo.

Nós somos uma empresa de desenvolvimento de carreiras. O difícil é entrar na empresa. O mais fácil é fazer uma carreira e crescer com a empresa.

O desenvolvimento da actividade a nível internacional foi crucial no período de crise que atravessou o sector. Qual o papel que o mercado externo vai ter no futuro próximo?

O mundo agora é global, não podemos falar do mercado português. Temos de falar do mercado europeu. Porque a tendência é a uniformização de regulamentos dentro do espaço comunitário que, aliada à mobilidade de recursos entre Estados, faz com que as empresas pensem em actuar cada vez mais dentro do espaço da Europa como se ela fosse um único mercado. A internacionalização foi o passo mais importante para a empresa. Foi ela que permitiu a empresa sobreviver e ultrapassar a profunda crise em Portugal.

Com o crescimento da economia em Portugal abrem-se boas perspectivas para o sector da construção e do imobiliário. Na sua opinião, estão criados os instrumento para a sua concretização?

O que vivemos na economia está alimentado por uma maior atracção do turismo para Portugal. É necessário ter consciência que o nosso turismo é suportado por um fluxo de viagens por avião. Esse fluxo é o mais frágil de todos. Rapidamente muda de destino. Portugal está na moda porque tem segurança, preços baixos, bom clima e boas tradições (comida, costumes, etc.). Mas assim que os preços subam ou que o turismo baixe, podemos rapidamente perder uma parte importante deste fluxo. Não está a ser criado um alinhamento na criação de oportunidades e a capacidade instalada. Se a Tesla quer fazer 300.000 carros, sabe que precisa de uma determinada capacidade fabril instalada.

Se estamos a licenciar um determinado volume de investimento privado e público, ninguém está a olhar e a fazer contas para a quantidade de recursos necessários. Temos de ter um de dois modelos de gestão: planeado ou reactivo. Não ter nenhum é que não funciona. Apesar de podermos melhorar no modelo planeado, acho que por sermos bastante reactivos. Não temos a escala e dimensão económica para um planeamento muito fino, mas podemos planear as grandes linhas mestras. Por exemplo, nas necessidades de mão de obra será extremamente difícil e errado definir contingentes de entrada de emigrantes. Mas se, por outro lado, estamos a permitir a construção de mais fábricas, mais habitação, etc., temos de implementar modelos que permitam o mercado reagir e trazer recursos para dar resposta a essas necessidades. É esse modelo e alinhamento que está a fazer falta.

Não existe uma visão global na fileira da construção

António Carlos Rodrigues considera que os diferentes intervenientes da fileira da construção não estão alinhados para que o crescimento deste sector seja uma realidade em breve. Na sua opinião, “não estão alinhados, porque não existe uma visão global”. Preocupado, desabafa mesmo “rapidamente vamos perceber que o país não vai crescer e aproveitar todo o potencial que tem pela frente porque não vai conseguir concretizar os investimentos que estão em pipeline”.

Autora: Elisabete Soares Saraiva