CONSTRUÍMOS
NOTÍCIA
Actualidade

 

 

 

 

Quem está a comprar as novas casas que chegam ao mercado?

28 de novembro de 2019

Está a construir-se demais? Quem vai comprar a nova habitação que chega ao mercado. Serão os estrangeiros ou os portugueses? Manuel Reis Campos, presidente da CPCI, Ricardo Sousa, CEO da Century 21 e Ascenso, director geral da Porta da Frente / Christie’s, respondem.

Cada vez mais chegam ao mercado empreendimentos residenciais de construção nova para se juntarem aos da reabilitação urbana, sobretudo em Lisboa e no Porto.

Depois da corrida dos estrangeiros ao imobiliário de luxo, surgem os projectos dirigidos à classe média e média/alta portuguesa. A escassez da oferta fez disparar as licenças para novos empreendimentos e o Diário Imobiliário foi saber se não se está a construir demais e quem vai comprar a nova habitação que chega ao mercado. Serão os estrangeiros ou os portugueses também estão na corrida?

Manuel Reis Campos, presidente da CPCI – Confederação Portuguesa da Construção e Imobiliário revela que o mercado da Habitação é muito vasto, abrange todo o país e diferentes segmentos. “É preciso ter alguma cautela com as generalizações. Veja-se que, no pior ano deste século, 2014, em plena crise financeira, foram licenciadas 6.785 habitações novas em Portugal. Em 2018, foram licenciadas 20.259, valor que é significativamente mais elevado, mas que representa apenas 18% do total apurado em 2011”.

O responsável adianta que geralmente a face mais visível deste mercado, é a construção e reabilitação de gama média-alta e alta e, “em particular, nos centros das nossas principais cidades, trata-se de um segmento que se destina, primordialmente, a investidores com maior capacidade financeira e, nesse domínio, a procura actual e a procura potencial continuam a dar sinais positivos”.

Já Ricardo Sousa, CEO da Century 21 Portugal, explica que do actual pipeline de projectos de construção de habitação residencial, mais de 60%, são direcionados para menos de 10% da procura actual.  “Contudo, acredito que esta situação já se está a inverter, com a chegada de mais projectos de obra nova aos mercados periféricos de Lisboa e Porto, que contemplam apartamentos com valores mais ajustados ao poder de compra dos portugueses, nessas regiões”.

O responsável adianta ainda que os primeiros projectos que estão a chegar ao mercado serão absorvidos por parte da procura internacional e por famílias nacionais que já possuem uma habitação paga mas pretendem trocar o imóvel, bem como por famílias que têm um rendimento acima da média e vão comprar a sua primeira casa.

Rafael Ascenso, director geral da Porta da Frente / Christie’s, refere ainda que o mercado está a atingir um equilíbrio e que só este ano se pode dizer que a oferta conseguiu equilibrar a procura. “Estamos por isso num momento de ajustamento do mercado. Podemos esperar uma estabilização média dos preços. Isto é, que alguns projectos excepcionais pela sua localização e concepção possam subir um pouco, e que outros possam descer pelo excesso de oferta numa determinada região, mas não esperamos uma baixa generalizada de preços”, admite.

Mas os portugueses irão conseguir comprar essas casas que chegam ao mercado? Manuel Reis Campos, fala em duas situações distintas para esta questão. “Quando estamos a falar das condições de acesso à Habitação, ou mais precisamente, do ajustamento dos níveis e preços da oferta de Habitação à respectiva procura, há que distinguir duas situações distintas. Por um lado, todos aqueles que, por questões de insuficiência de rendimentos, não tem possibilidade de aceder ao mercado e, para esses, o Estado tem de assumir a sua função social e que, de resto, ficou bem expressa na Lei de Bases da Habitação, que foi recentemente aprovada”.

Por outro lado, o presidente da CPCI indica que para a generalidade da população, é necessário garantir condições de funcionamento eficazes para o mercado e, desde logo, atrair investimento e aumentar a oferta de casas destinadas à classe média e aos jovens. “Tal como acontece na esmagadora maioria das cidades, não é expectável que, em determinadas áreas dos centros urbanos, a habitação a custos acessíveis seja a principal função desses espaços. Mas é precisamente para responder a esses desafios que o planeamento estratégico deve existir, bem como instrumentos de dinamização do investimento que permitam, ao mercado, oferecer as soluções exigidas”.

Rafael Ascenso, é de opinião que nos dois últimos anos os promotores têm estado atentos à procura por parte do mercado nacional e nomeadamente do segmento médio. “Já estão a surgir vários projectos destinados a este mercado. E outros estão em fase de concepção. É por isso expectável que o aumento da oferta associado a uma taxa de juros baixa permita que os portugueses tenham acesso a habitação nova e de qualidade”.

No entanto, a maior parte da oferta ainda é para os estrangeiros. Ricardo Sousa, revela que na rede Century 21 Portugal, constata-se que a procura internacional está a pretender, e a concluir, transações de imóveis até 300 mil euros. “Facto que está a levar muitos destes clientes a olharem para outros mercados e outras regiões turísticas de Portugal, para identificarem melhores oportunidades de compra e investimento, em linha com os seus orçamentos”.

Reis Campos, também fala na procura de investimento no interior por parte dos estrangeiros. “É importante aproveitar este momento positivo e alargar a reabilitação urbana a todo o território e, concretamente, atrair algum deste investimento estrangeiro para outros espaços, designadamente para o interior. No ano passado, o investimento estrangeiro em imobiliário nacional atingiu os 5,2 mil milhões de euros e há condições para manter uma trajetória crescente”.

De facto, os estrangeiros ainda são os principais investidores do nosso imobiliário. No entanto, o diretor da Porta da Frente / Christie’s, avança que possamos registar um abrandamento nos mercados que mais têm comprado em Portugal nos últimos anos como o Brasil, França e China pela curva natural do fluxo de interesse. “Mas novos mercados estão a surgir, nomeadamente na Europa, no Oriente e até dos Estados Unidos temos sentido um interesse crescente”. Rafael Ascenso, esteve recentemente em Estocolmo, na Suécia, a promover mais um evento de divulgação junto do mercado Sueco. “O interesse continua e os atractivos, para além do fiscal, são hoje muito vastos: segurança, custo vida muito abaixo da média europeia, clima, história, infraestruturas e principalmente a nossa capacidade de integração plena dos estrangeiros que escolhem Portugal para viver ou investir para passar uma temporada”.

Deslumbramento do mercado?

Questionados sobre um possível ciclo de deslumbramento do mercado, Ricardo Sousa, admite que existe uma clara necessidade de obra nova em muitas zonas de Portugal, nomeadamente na Área Metropolitana de Lisboa e do Porto. “Contudo, é necessário apostar na industrialização da construção para se conseguirem tempos de obra e de estaleiro mais rápidos, processos construtivos mais eficientes e com maiores critérios de sustentabilidade ambiental, o que, naturalmente, irá permitir controlar melhor os custos de construção, e possibilitar que se coloquem no mercado imóveis com valores ajustados à realidade do rendimento dos portugueses”.

Na sua opinião, é necessário também inovar na definição das tipologias, áreas de cada imóvel, acabamentos e outras caraterísticas, para que a solução de habitação e o seu valor final seja ajustada às reais necessidades e capacidades financeiros das famílias, em cada mercado específico. “O que considero fundamental é que se pense em construir habitações adequadas ao real poder de compra dos portugueses, ao invés de construir para o conceito aspiracional de habitação, com critérios aleatórios, e em cada mercado”.

Reis Campos, salienta que ao contrário do passado, o ciclo imobiliário é, em grande medida, global. As taxas de juro e as restantes variáveis da política monetária são decididas centralmente, os fluxos de capital circulam à escala global e o crescimento a que se tem vindo a assistir no mercado imobiliário aconteceu um pouco por todo Mundo e Portugal não é excepção. “Enquanto se mantiverem estas tendências globais e Portugal conseguir manter um posicionamento competitivo, a expectativa é de consolidação e de manutenção de uma evolução positiva. O bom momento que o país atravessa ao nível do turismo, a falta de atractividade dos produtos oferecidos pela banca, o potencial do nosso território e um cenário macroeconómico relativamente estável são argumentos que sustentam essas perspectivas”.

O que esperar do mercado?

Sobre o que podemos esperar do futuro, Rafael Ascenso, acredita que a generalidade dos projectos novos vem elevar o nível da oferta de habitação. “A vários níveis, como conforto, arquitetura e urbanismo. Mas pode acontecer que alguns não estejam ajustados à procura. Mas isso será o próprio mercado a decidir. Como qualquer outro mercado”.

Para o CEO da Century 21 Portugal, a expectativa “é que este aumento de oferta ajustada à procura venha contribuir para uma maior estabilização dos preços dos imóveis”.

Reis Campos completa as expectativas e admite que Portugal está a criar condições para atrair mais e melhor investimento, sobretudo nestas áreas que se estão a tornar mais dinâmicas. “E não me refiro, apenas, a algumas celebridades mediáticas que escolheram o nosso país para morar. Há projectos importantes de empresas, em domínios como centros de investigação e desenvolvimento de produtos, de novas tecnologias, de serviços financeiros, entre outros, que estão a escolher as nossas cidades para se instalarem ou expandirem negócios. E já não estamos a falar, apenas, do turismo, que continua a progredir positivamente. É importante continuar este movimento e colocar Portugal na rota destes investidores, já que são essenciais para o nosso futuro.